ARTIGO – Sob e sobre ameaças. Por Marli Gonçalves

Vivendo sob constantes ameaças, e que só aumentam, vindas de todos os lados. Não bastassem as lutas para controlar a pandemia, o surgimento de novos vírus e outras doenças esquisitas, os problemas com energia, água, temperatura, economia, no Brasil vivemos mais um pesadelo, o político. Qualquer homenzinho, ou serzinho verde oliva, agora aparece cheio de marra, e ameaçando a democracia.

Ameaças

Temos muitas dúvidas, perguntas, pedidos de esclarecimentos, e temos ouvido quase sempre as mesmas não-respostas. Repara quantas vezes, nós, da imprensa, perguntamos, perguntamos. “Mas até o momento não obtivemos resposta”. Todo dia. As revelações, gravações, denúncias, fatos e fotos, falas e gestos se sucedem.  Parece que estão brincando de governar, e estão; sem rumo. Mas jogam pesadamente pelo poder – e com as nossas vidas.

Para quem já viveu momentos difíceis, apenas uma clareza: antes, sabíamos exatamente o que, quem, como estávamos combatendo ou de quem deveríamos nos defender. Agora, apenas a ignorância grassa e é como se o inimigo morasse ao lado, e possa surgir nos surpreendendo. Os descobrimos entre pessoas próximas, amigos, familiares, numa divisão sem igual. Contaminam todos os ambientes.

Os ataques podem ser tão sub-reptícios que até uma deputada acorda machucada, com fraturas, e sem saber exatamente o que ocorreu denuncia poder ter sofrido um atentado. Muito louco? Não, se pensarmos que agora tudo é mesmo possível, inclusive para quem amigo deles era; e inimigo deles, virou. O que aliás tem sido muito comum: o abandono desse barco que navega sem sentido e em uma tenebrosa maré. Maré obscura, armada, violenta.

Ultimamente, não sei como, descobriram uma palavra que usam para tudo e que duvido saibam exatamente qual o seu sentido: “narrativa”. Escuta só uns minutinhos de CPI. Escuta um minutinho do discurso de justificativas e negações deles. Até o presidente, que não é o maior afeto ao vocabulário humano, outro dia disparou “narrativa” para lá e para cá. Lá vem ela: tudo que os afeta é narrativa incorreta.  Só a deles – e que vem eivada de ódio e erros – é que deveria ser ouvida.  Tentam adestrar com decorebas os seus bovinamente seguidores, pouco importa o que falam, mesmo que logo depois contradigam-se.  O recheio de informações falsas que usam cria uma espécie de hipnotismo, repetições ao molde de treinamento de animais. Contam um conto, aumentam muitos pontos.

Isso não é ideologia, direita, esquerda, volver, nem centro, nem de cima nem de baixo. Para ser ideologia tem de haver inteligência, conhecimento, estudos, lógica, contraposição, debate. Assim a gente descobre porque é tão difícil lidar com eles, são apenas chucros estes que estão no pódio do poder central, ladeados por muitos outros, instalados em outros poderes. Infelizmente, inclusive na imprensa, muitas vezes a pesados soldos.

Agora a questão é duvidar das urnas eletrônicas, pregando o voto impresso, mesmo que se diga e repita a confiança nessa forma de voto. Não deve passar essa iniciativa. Tomara que não. Mas eles inventarão outras ameaças nesses meses que antecedem a eleição do ano que vem, e que infelizmente ainda não nos apresenta uma lista de candidatos fortes o bastante para recolocarem o país nos trilhos.

“Se urnas são confiáveis, dá um tapa na minha cara”, pede Jair Bolsonaro, ao duvidar do próprio sistema eleitoral que o elegeu, sem apresentar provas.  Será que vai ser preciso agendar? Pode entrar quantas vezes na fila?

Ele que está pedindo. Nós não ameaçamos, mas ainda creio que saberemos como nos defender.

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MARLI - cgMARLI GONÇALVES – Jornalista, consultora de comunicação, editora do Chumbo Gordo, autora de Feminismo no Cotidiano – Bom para mulheres. E para homens também, pela Editora Contexto.  (Na Editora e na Amazon). marligo@uol.com.br / marli@brickmann.com.br

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ARTIGO – O frútil e as brincadeiras de criança. Por Marli Gonçalves

Não escrevi errado, não. É frútil mesmo. Adoro inventar palavras e essa já vai ser mais uma; assim, com acento, um misto de fútil, útil, frívolo, com umas pitadas de dislexia. Coisas fúteis são aquelas fúteis com alguma serventia, nem que seja a de fazer pensar um pouco sobre o nada

O frútil tem alguma valia. E nesse momento tão chato, triste, mal humorado, perigoso, precisamos de dar algum valor à quantidade de pessoas, artistas, personalidades, celebridades e subcelebridades que, de forma até impressionante, estão fazendo de um tudo para não submergirem. Nos mostram suas casas, seus sentimentos e acontecimentos mais íntimos, se abrem todos, mostram seus corpos (e isso é legal), se casam, descasam, saem dos armários, abrem seus armários. Cometem até ilegalidades, como dar festas em plena pandemia, como vimos algumas. Até o cancelamento promovido pelos interneteiros – quando ocorre – é bem-vindo – vira notícia, entra para o #trendtopics. Virou notícia? Tá bom para eles. E tá bom também para a imprensa que cada vez abre mais e mais espaços para esse mundo. O fútil vira frútil.

Nesse universo paralelo, colorido, quase todo mundo é bonito. Quando não é, se remenda, repuxa, corta aqui, ali, faz harmonização facial, o hit. Ou desfaz, que até isso a gente tem visto ir para o Fantástico – a desarmonização facial. Teve tempo que o quente era tatuar o nome do amado ou da amada, mas como cada vez as relações estão mais efêmeras e tirar as tais letrinhas da pele custa caro e dói, parece que passou essa onda. Já pensaram a Gretchen, que está no 18º casamento, se fosse adepta? O corpo seria uma lista, tipo aprovados do Enem, em ordem alfabética. Ou iria ficar buscando repetição. Josés! Joões!

Hoje mesmo li uma notícia bomba: Gracyanne Barbosa comeu mais de 8 mil ovos durante o isolamento social – anunciou a capa de um dos principais portais de informação do país. Nossa, mudou minha vida. Saber isso, capaz até de mudar a sua também. Predadora. Escondam suas galinhas. Cuidado com os ninhos dos passarinhos. Uma outra apareceu mostrando seu novo pet, um sapo de raça exótica, a quem deu o nome de Snoopy. Vou parar por aqui, mas se você rodar pelos portais vai se divertir.

Enfim, os frúteis, como dizia no início, têm uma função importantíssima nesse momento – a de nos fazer rir em meio a tantas desgraças e à proximidade de uma eleição, onde alguns candidatos, parece, resolveram entrar nessa onda. Assistam um pouquinho os hilariantes segundos eleitorais. Não perca a Joice Hasselman, dezenas de quilos mais magra, nos trinques, com a autoestima lá em cima, usando até a Peppa Pig (como era chamada pelo clã dos Filhos do Capitão), misturando desenhos animados. Uma coisa louca. Temo que não dê votos. Mas pelo menos suaviza nossa vida e nos faz executar o exercício que tira rugas – rir, sorrir. Não precisamos mais de usar tanto ácido hialurônico – quando rimos nosso corpo produz um pouquinho, diz a lenda. Brincadeirinha! É que rir/ sorrir faz bem de alguma forma. Isso é certeza. Nem precisa de cremes ou injeções.

Se fosse “só” a pandemia nosso problema… Ainda há – graças até à Nossa Senhora de Aparecida, que festejamos como a nossa Padroeira agora dia 12, junto com o Dia da Criança – uma parcela da população que pensa, e está aterrorizada com o que diariamente assiste, e que é sério. Não é frútil. Mas essa parcela – que esperança é a última que morre – há de florescer mais pós-vacina; agora está anestesiada, perplexa, ou sem condições de agir.

Comungo com essa parcela. Que se estiver fazendo o que estou pensando – e que eu aqui estou nessa – prepara quietinha a “Lista de Bons Motivos para ir à rua protestar”.

Já virei a página da lista que escrevia manualmente. E cada dia me preocupo mais e me pergunto se quando fizermos isso, ir às ruas, não será tarde demais, muito tarde demais. Já tem cargo praticamente vitalício sendo negociado, e o que em mais alguns dias, já era. Já foi. Entrou tudo.

Enquanto isso, ora, vá ser frútil na vida! É o que dá agora. Vai que de repente chama a atenção e consegue mudar o rumo das coisas.

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MARLI GONÇALVES – Jornalista, consultora de comunicação, editora do Chumbo Gordo, autora de Feminismo no Cotidiano – Bom para mulheres. E para homens também, pela Editora Contexto. À venda nas livrarias e online, pela Editora e pela Amazon.

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