ARTIGO – O Pior Ralouin do Mundo. Por Marli Gonçalves

Tudo bem que, como todas as questões têm dois lados, pode não ser o pior, mas o melhor, a partir do ângulo que se queira do Ralouin BR que se aproxima e que atravessará todo o país. Se você for um daqueles chegados numa história de terror, sem doces e sem travessuras, vai gostar do Halloween desse ano – que vai ser mesmo de amargar. Mas vamos viajar um pouco para o mundo das fantasias, do futuro, ou dos pesadelos, se preferir. Venha…

 

Era uma vez uma criancinha que acabou ficando cheia de dores e com problemas sérios na coluna cervical. Não que ela tenha tido essa mania de ficar olhando o celular com a cabeça baixa, pescoço curvado, não; ao contrário, foi porque ela passa muito tempo olhando para cima sempre que pode, teimando, com o pescoço bem levantado. Ela quase não sai de casa, fica ali, estudando à distância, que tinham achado que essa era a melhor forma dela não se contaminar com ideias sociais ou revolucionárias. Inventaram até um kit-papão para assustar a garotada.

Quando ia na janela ou no quintal, tinha essa mania, ficava com o pescoço quebrado pra cima, olhando o céu, esperando que passasse pelo menos uma – uminha que fosse já a faria feliz – cegonha, carregando um bebê na trouxinha, como disseram que foi assim que chegou nessa casa pro papai e pra mamãe. Nunca ensinaram a ela como os bebês eram feitos. Ela não sabia de nada dessas coisas, porque não achavam certo explicar nada para criança. Esses adultos! A cegonha nunca passou.

Mas ainda havia escolas, que bom! Havia ainda outros lugares fechados, como condomínios, onde grupos de crianças podiam ainda brincar todas juntas, sem adultos no meio, e meninos e meninas podia conhecer suas diferenças rosas e azuis ou roxas. Brincavam de mocinho/a e bandido/a, de pega-pega (ops!), de médico, uai, sim, que tem brincadeiras que atravessam o tempo. Como essas crianças de hoje são muito inteligentes, logo descobriram vários cantinhos onde podiam brincar longe das câmeras, que estão espalhadas em muitos lugares, vigiando tudo o que acontece. Sentiam coisas diferentes, viam até uns duendes, uns serezinhos que apareciam para fazer cócegas que eles gostavam muito.

d06db-bruxa2bhalloween2b21E então chegava o final do ano, e as Festas. Alegria! Tiro ao alvo! As criancinhas eram então ativadas, incentivadas a, além de acreditar no Papai Noel, acertar nele, já que andava de vermelho, essa cor tão perigosa, com os seus revólveres, mãozinhas em riste. Tinha virado moda ensinar as crianças a atirar – com cinco anos já começavam – seguindo uma moda lançada por um presidente que a alardeou, contando que foi como criou os machos que eram seus filhos. A filha só brincava de princesa do país tropical que adorará vê-la crescer nos próximos anos.

Aconteceu na história que os vampiros, lobisomens, diabinhos, elfos e duendes, bruxas, e até os santos e suas imagens, que passaram a ser boicotadas, começaram a se juntar, e se unir aos negros, índios e mulheres, homens sensíveis e também com mais muita gente que não aceitava que mandassem em suas vidas particulares, o fato que a todos unia. Logo na época de Páscoa lançaram um movimento, uma campanha. Não, não era mais para procurar os ovinhos de coelho, mas um outro ovo, os da serpente, ovos que tinham sido rompidos numa eleição ocorrida fazia pouco tempo e muitas dessas serpentes se espalhavam pelo país, sacudindo seus chocalhos, envenenando as famílias, e atacando quem não conseguiam mais hipnotizar com suas ideias retrógradas e bravatas.A bruxa queria pegar a menininha

Moral da história: passaram todos a ficar esperando a chegada de um novo protetor, que fizesse outras promessas – que o povo adora acreditar em promessas. E agora, quando de noite esse povo dorme, sonha com ele, o Saci, que pelo menos em folclore dizem que protege a mata e o meio ambiente, uma das primeiras vítimas desse pesadelo todo. Assim, crianças, no próximo 31 de outubro, Ralouin, preparem-se. Já estaremos todos pulando com uma perna só sobre brasas. E bem ralados.

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Marli Gonçalves, jornalista – Também acredita em contos de fadas. Cuidado com a Cuca.

marli@brickmann.com.br   /   marligo@uol.com.br

2018, booo!

ARTIGO – Monstrinhos nacionais. Por Marli Gonçalves

tumblr_mmsj2xFg1w1qzp9weo2_400Não tem mais jeito. Eles estão entre nós. Aliás, você pode estar nesse mesmo momento aí pisando em algum deles, nos monstrinhos mais caçados do mundo, mais do que pelo FBI, Interpol, CIA, KGB, essas coisinhas se imiscuíram no nosso meio e vêm sendo procuradas nas ruas e parques por milhões de pessoas. Mas, e o que você caçaria com gosto?bcd3ae_881e7896b7774e2889fdaa95723ce1c8~mv2

Vocês sabem, a coisa tá feia. Vivemos pensando em alternativas sustentáveis, ou melhor, que nos sustentem, e para isso nossa criatividade não pode ter limites. Deu-se então que imaginei um aplicativo verde e amarelo, na cola desse Pokemon Go. Um dos senões é só o uso da tal realidade aumentada, e que vai fazê-lo ser proibido para menores porque se ainda aumentarmos essa nossa realidade as crianças precisarão sair da sala, ops, da tela.

Estou achando engraçada esta febre, nada tenho contra; ao contrário, vou dar risada se vir alguém se esboroando aí pela rua – já faziam isso com o whatsapp mesmo, não sei por que tanta gritaria contra quem está por aí brincando de colher esquisitinhos coloridos, acertando-os com boladas estilingadas, atrás de seus ovos e ginásios. Parece um monte de cisnes, pescoços curvos, dedos nervosos, arrastar sinuoso.4wigglytuff

Claro, agora aumentou, tem razão, porque continuam teclando, fazendo selfies, e jogando. Fui ver isso na Avenida Paulista: montinhos, gente sozinha, gente andando em fila, gente disfarçando, gente parada apontando o celular para todos os lados como quando precisávamos ficar procurando sinal para conseguir usar o telefone, lembram? Lembram de algumas das posições ridículas em que ficávamos para conseguir falar? Pois é. Parecia aqueles exercícios de ioga, de equilíbrio, de ensaio para trapezista.

Então, pensei que, como existe tanta gente disposta assim a ir para as ruas, vamos bater perna atrás de malfeitores e malfeitos. Temos tantos monstrinhos nacionais a catar, que o GPS não vai dar conta.

Claro, da mesma forma os níveis iriam subindo, aumentando, pontos sendo conquistados, e a pessoa ia ficando importante, importante, até ser reconhecida publicamente. Tipo o juiz Sergio Moro, para dar um exemplo, e que já parece estar pensando num aplicativo desses faz tempo; anda exercitando o nível premium desse jogo. Será que ele dá pontuação particular para algumas de suas presas? Não sei por que, mas tenho a impressão de que ele agora já está perto de acabar a caçada, na fase final, atrás do monstrinho peludo mais valioso e raro, único. Vocês sabem quem.3pikachu

Nesse jogo Pokemon Go são 151 bichinhos para catar. 142, pelo que entendi, encontráveis, alguns mais difíceis que outros, mas esses restantes estão só em lugares específicos, em continentes. Na Ásia, Farfetch’d; na Oceania, Kangaskhan; nas Américas, um tal Tauros; e na Europa, Mr. Mime. O africano ainda não foi revelado.Nossos monstrinhos nacionais seriam de uma diversidade única, porque tem coisa que só aqui mesmo.

Ainda estou pensando nos nossos alvos, tropicais, que também podem ser coisas boas. Para começar, poderíamos caçar lixo posto enfiado em árvores para a minha campanha #árvoreNãoéLixeira. Lixo jogado nas ruas.

Gente falsa. Fofoqueiros. Postos de Saúde que tenham remédios. Empregos. Ongs sérias. Governantes comprometidos. Eleições limpas. Bons professores. Preços mais baixos. Belezas para encantar os olhos e as mentes. Os amores de nossas vidas. Se bem que pensando bem, esse último item outros aplicativos já estão oferecendo, embora sem muito êxito pelo menos no meu caso.

Vou continuar desenvolvendo a ideia. Peço ajuda. Me conta: o que faria você sair caçando com tanto gosto por aí?

gif-fofo-monstrinhoMarli Gonçalves, jornalista – Prometi a mim mesma caçar só dois ou três monstrinhos desses por dia, para não viciar de vez, pode até ser aqui dentro de casa mesmo se aparecerem. Claro, isso pelo celular. Na vida real, não tem jeito, é correr de monstro-conta, matar leão, quebrar galho, pisar em ovos, e ser de circo para se manter dia após dia com pelo menos a mente sã. E salva.

São Paulo, ao gosto olímpico, 2016

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