ARTIGO – Na Urbe: desorientados, desnorteados e largados. Por Marli Gonçalves

Não há batatinha amarrada na fronte que resolva. Calmante que acalme. Protetor de ouvido que dê conta. Se a pessoa anda armada é um perigo sair dando tiros. Se achar uma granada o perigo será destravar a rolha e mandar bem no alvo, virando um terrorista urbano. Morar em São Paulo está ficando a cada dia mais impraticável. E não é só o barulho.

Você vai ficando louco, começa a pensar em tomar as medidas mais drásticas, tem os pensamentos mais subversivos, terríveis, punks. Os instintos mais primitivos. O barulho vai corroendo as entranhas, tomando conta. Os obstáculos e situações estressantes se acumulam. Os problemas da cidade e a falta de controle e fiscalização chegaram a um nível insuportável e que afeta gravemente a nossa saúde. Que será preciso para que providências reais sejam tomadas para melhorar nossa qualidade de vida?

No momento, me perdoem, tenho dúvidas, inclusive, se a cidade está sendo habitada apenas por bananas; se ao meu redor só existem pessoas bananas, medrosas, já tão acostumadas a ser massacradas que ficam sem reação, não se defendem mais de nada, inertes, palermas.  Não reclamam, esperam que alguém o faça. A vida real está passando ao largo nesses tempos digitais.

Escrevo nesse momento com uma dor de cabeça daquelas, daquelas que irradiam, sabe? Se fosse uma sessão de tortura creio que entregaria até a minha mãe, confessaria coisas inconfessáveis, os segredos mais recônditos, desde que me prometessem o que venho considerando uma dádiva: o silêncio.

Estou, e claro não sou só eu, mas um monte de gente que mora aqui por perto, submetida a – escutem, por favor, tenham pena de mim – horas a fio, diárias, de uma britadeira em uma construção próxima. No meu prédio, mais próximo ainda, soma-se uma obra que já dura quase um ano e que alterna serra elétrica, bate-estacas e outros sons que vão se infiltrando na mente. Isso junto às sirenes de ambulâncias, buzinadas frenéticas, rota de helicópteros e aviões, latidos e ganidos de pobres cachorrinhos deixados sós o dia inteiro, criancinhas birrentas, funkeiros motorizados, entre outros sons, até como os vindos de revoadas de periquitos verdes chalreando.

Aí você sai de casa. Fora a vontade de usar colete à prova de bala, carregar arco e flecha, gás de pimenta e/ou outros apetrechos básicos para se defender, encontra a buraqueira nas ruas e calçadas. É tibum na certa. A falta de educação das pessoas que avançam como se você não existisse. Os motoqueiros que inventaram uma via imaginária entre os carros e querem que você encolha seu veículo como o daquela cena famosa do Gordo e o Magro. O carro fininho passando no cruzamento.

(Confesso: outro dia pensei seriamente em comprar uma máquina de choque elétrico para usar nesses casos. A ideia seria colocar a mão pra fora rapidinho no momento que um desses estivesse te apertando com aquela buzininha infernal. Bzzz, Bzzzz, fritado igual faz aquela raquete de pegar mosquito.)

Mas quero ainda focar em mais um detalhe: notaram como está (ou melhor, não está) a sinalização das vias? Quando há placas estão sujas, tortas, viradas, ilegíveis, cobertas, erradas. Tenta procurar um endereço. Um número na rua. Uma faixa pintada direito no chão. Não há Waze que resolva. Ao contrário, como aconteceu comigo esses dias, essezinho aí me fez andar inacreditáveis 35 quilômetros errados até um endereço que só achei quando o desliguei – um dos maiores alívios que senti nos últimos tempos. Até porque quem disse que ele funciona direito direto? Você está lá, seguindo, por exemplo, na frente de um viaduto que não sabe se é para pegar. E o que acontece? Zona morta, apagada, cinzenta, sem GPS, sem sinal, sumiu aquela vozinha para te orientar. Já era.

Ah, vá! Já aconteceu com você também, tudo isso, não é?

______________________________________________

 Marli Gonçalves, jornalista – Para que me entendam melhor, pelo menos uma parte do problema, gravei. Ouça. Quem sobrevive a isso, durante dias, o dia inteiro? https://soundcloud.com/marli-gon-alves/sets/barulhos-infernais

  SP, insuportável, especialmente em fim de um ano como este aqui.

____________________________

marligo@uol.com.br
marli@brickmann.com.br
www.brickmann.com.br
www.chumbogordo.com.br
____________________________      

ARTIGO – Psiu, parem esse barulho dos infernos

Marli Gonçalves

Estão fazendo uma reforma no apartamento bem embaixo aqui do meu. É tanta marretada, porrada, descascada, derrocada em todos os recintos aqui embaixo dos meus pés, que a casa toda treme. Os quadros estão tortos, caem coisas pelo chão, os rejuntes dos azulejos estão abrindo. Tem a serrinha, cortando, com aquele barulhinho contínuo e agudo. E a lixinha fazendo chiquichiqui…

Eu não mereço. Juro que não. Poucas horas e dias de folga, oportunidade de ficar mais em casa, ler, escrever. Dormir. Queria pelo menos, sei lá, ficar pensando sossegada, tentar ouvir o silêncio. Mas aqui estou eu, ledo engano, sendo tocada de minha própria casa, sem conseguir pensar em mais nada a não ser esganar um, irromper no apartamento que está sendo – só pode ser – reconstruído, esticado e remodelado para virar um palacete. Parece que o nome é retrofit, mas estou mesmo é querendo xingar de outra coisa.

E se eu fosse lá? Eles vão se assustar com minhas olheiras. Acho que vou deixar o cabelo bem desdeganhado para parecer a mais maluca. Poderia amarrar um cinto bomba falso e ameaçar explodir tudo se eles não pararem.

E se eu ligar para o bispo? Sempre falam para reclamar com o bispo, quem sabe? Não é pecado fazer obras nesta época do ano? Ou será que deviam obrigar o dono a ficar junto o tempo inteiro também sendo torturado com o barulho igual faz aos vizinhos? Depois das primeiras reclamações consegui apenas – por um lampejo de bondade – que as obras recomecem meia hora mais tarde, dia após dia, que eles sempre dizem que estão acabando.

Vivo ouvindo que uma mulher na TPM é capaz de matar se instada e irritada. Nunca senti muito esse efeito, mas agora entendo como ele se passa. Também pode acontecer quando o caso é barulho. Um assunto que está tomando proporção assustadora – e que é bom que todos os lugares se liguem o quanto antes para também não virarem o inferno para os ouvidos. O barulho vai irritando, irritando, tomando conta do seu pensamento, como um círculo vicioso do qual você não consegue se livrar. Não dá para esquecer ele ali.

Foi constatado que o que as pessoas acham que mais piorou nos últimos três anos foi exatamente o ruído, o barulho, o som infernal, a zoeira constante. Passou batida nesse lufa-lufa de fim de ano essa pesquisa importante, não só para a cidade de São Paulo, onde foi feita, mas acho que para todos os lugares onde se pretenda criar algum tipo de civilização. E de civilidade, quando e enquanto ainda for possível conversar com os humanos. Está beirando o insuportável.

Veja, estamos falando que o barulho foi o item que piorou mais do que tudo. Mais do que o trânsito, educação, moradia, segurança – que também pioraram, mas nem tanto. Não há mais sossego para quem vive numa cidade assim, e isso faz muito mal inclusive para a saúde. Decibéis a mais fazem estragos horrorosos em nossos organismos. Por exemplo, acima de 70, que você mede em qualquer rua de tráfego intenso, já aumentam riscos de enfarte e até de infecções, entre outras doenças sérias, porque a nossa imunidade é afetada.

Barulho é definido como um som indesejável. O que é engraçado é que o critério é pessoal, individual, e sons até agradáveis para algumas pessoas podem ser completamente desagradáveis para outras. Vide alguns gêneros musicais que andam por aí.

Então, o julgamento do que é barulho é individual. Pode até ser. Mas não esse que estou suportando. Estou falando do barulho da pesada. Essas teorias de relatividade me dão uma cansada! Não sei se é a malvada da falta de sorte, mas barulhos me perseguem. Os caras que catam o lixo do restaurante da frente são os terrores de todas as minhas manhãs, batendo caçambas. Os imbecis, bêbados, destravados e destravadas que saem para fumar do lado de fora da casa noturna “elegante” e “chique” aqui do lado, parecem matracas nas madrugadas. Sobre umas coisas, fiz o que pude. Mas sozinha, a andorinha… Polícia é pontual, embora outro dia um vizinho tenha chamado a cana e só assim acabou com uma festa de arromba que todos aguentaram até as cinco e meia da madrugada, em plena calçada.

Você já parou para pensar no cerco do barulho? Para onde olho, ou melhor, abro meus ouvidos, têm obras, buzinas, alarmes disparados, sirenes, escapamentos abertos, motocicletas com motociclistas aloprados, tontos acelerando, apitos, avião, helicóptero, pessoas falando muito alto.

O barulho isola, tortura. Descobri um site chamado chega de barulho, que cuida só – vejam – de questões “entre as pessoas”. A chamada é: “O site para quem está cansado de ser incomodado”. Mas em geral, para eles, a questão é apelar para vias judiciais, já que o site é de um advogado.

Mas também achei outros sites, muito loucos, que não entendi bem quem é que banca, se só os banners de propaganda: com barulhos do mar, barulhos da chuva e som de pássaros. Só podem ter sido criados quando alguém pirou de vez, de tanto se esforçar para esquecer – impossível – o barulho de algum vizinho, de alguma obra.

Um barulho que temo seja também o do progresso, das mudanças, que não param.

São Paulo, quebração dia e noite, de um otimista ano de 2012. Feliz, que você seja feliz como nunca! (*) Marli Gonçalves é jornalista. Já baixou um aplicativo com medidor de decibéis, embora ainda não saiba exatamente para quem reclamar. E se adianta.

************************************************************
E-mails:
marli@brickmann.com.br
marligo@uol.com.br
ATENÇÃO: Por favor, ao reproduzir esse texto, não deixe de citar os e-mails de contato, e os sites onde são publicados originalmente http:// http://www.brickmann.com.br e no https://marligo.wordpress.com// Aqui você encontra todos os artigos anteriores:www.brickmann.com.br
Estou no Twitter, @MarliGo, Facebook, e no blog : Clica aqui, para ir lá no blog! Visite o site MARLI GONÇALVES – Onde você encontra de tudo e muito mais
No Twitter, esperando você: “www.twitter.com/MarliGo

PROGRAMAÇÃO IMPERDÍVEL: LIVRO DE NEWTON MESQUITA

Amigo Newton Mesquita,

Uma das pessoas mais legais que já conheci nessa vida. Feliz, boa praça e um profissional simplesmente maravilhoso e um dos artistas que mais gosto de ver, não só ele, como suas obras.

Geminiano de 6 de junho tem características que prezo demais – a gentileza e generosidade.

Fora isso, adora um “brinquedinho” novo, um gadget qualquer. Vou fazer umas fotos das obrinhas que tenho dele – gravuras, mas para mim tão valiosas como pinturas, porque levam seu autógrafo, e depois publico. Por enquanto achei umas especiais.

Fiz uma seleção de imagens feitas durante uma de suas últimas exposições, em 2008, no MUBE. O maravilhoso que aparece na frente das telas é o Carlucho, meu irmão…

Newton Mesquita: uma delícia de pessoa e de artista

Este slideshow necessita de JavaScript.

 Imperdível.

Arquiteto, pintor, artista plástico, ilustrador e produtor de capas de revistas e livros Newton Mesquita lança livro que leva seu nome, em que mostra mais de 200 imagens de trabalhos de vários períodos de sua carreira. A apresentação é de Thomaz Souto Corrêa, com textos

de Paulinho da Viola, Jacob Klintowitz, Arcangelo Ianelli, Pietro Maria Bardi e Arnaldo Jabor.

DIA 17 DE MAIO, TERÇA-FEIRA

Das 18h às 22h, na Livraria da Vila dos Jardins (al. Lorena, 1.731), sp-SP