ARTIGO – Juras de Junho. Por Marli Gonçalves

Junho sempre é mês especial, até porque nele inclusive fecho mais uma dessas voltas ao redor do Sol na vida louca. É mês que marca muitas festas populares, muitos santos reverenciados, promessas, arrasta-pés que levam a um estado de embriaguez e cheio de corações cata-enamorados espalhados nas vitrines. Mas…

Como anda difícil simplesmente ser feliz, viver a vida, quando se é sensível. Quase metade do ano já se foi e, teimosos, nos mantemos esperançosos neste imenso país tropical, nessa gigantesca aldeia global, onde creio que, espaço tem, deve haver algum cantinho desconhecido onde ainda seja possível manter-se alheio à realidade assoladora e aos fatos inquietantes próximos ou distantes.

Aiaiai, quanto mais a gente reza, mais o nosso coração sofre com as notícias que chegam de todos os lados, uma sobrepujando a outra, como se todas elas fossem naturais e devêssemos apenas seguir em frente.

A imagem daquele homem assassinado sufocado por gás dentro de um carro de polícia no Sergipe seguirá aterrorizando nossos sonhos e ficará esperando a Justiça onde quer que se vá. Assim como daquele que teve seu pescoço apertado por coturnos longos minutos se debatendo. Tudo registrado, provado, visto. Real. Se repete.

A malvadeza, se pode dizer, atinge a todos: especialmente os negros, as mulheres, as crianças, os povos originários que vivem naquele cantinho onde havia paz e uma comunidade. Ou nas comunidades emanadas da miséria que recebem a visita do que seria a lei, e o saldo são corpos cravejados contados em números flutuantes.

E ainda tem guerra, melhor, guerras, muitas, as reais e as que travamos diariamente contra nossos próprios medos. As crianças mortas por balas que zunem e elas não tinham a menor culpa de haver uma indústria que movimenta toda a política internacional, dos Senhores das Armas, e que também aqui, infelizmente, encontra guarida e incentivo.

A loucura piorada que atinge a todos de uma forma ou outra, seja os jovens desesperançados que compram as armas e matam, sempre pensando numa vingança que os dominou durante a vida social com a qual não souberam lidar, seja a que libera a maldade em atos inexplicáveis, como essa recente maldição das madrastas – uma que joga o enteado pela janela durante uma briga; a outra que trama envenenar os seus, mata uma, dois meses depois tenta acabar com o outro, e da mesma forma, ainda por cima fazendo sofrer, por envenenamento. Eram pessoas acima de suspeita, sabemos depois.

Pessoas acima de suspeita estão sempre muito perto de nós. E as que suspeitávamos e tentamos tanto avisar, sem sermos ouvidos, do perigo que representavam, estão aí, aqui, ali, inclusive mandando, governando vários povos, como o nosso, e cercando-se sempre de outros seres piores ainda.

Ah, mas a história diz que sempre foi assim. Não. Não tem de ser. Tanta modernidade, tecnologia, vem servindo para o quê? A comunicação que acreditávamos ampliada nos divide, e sem que possamos nem reagir já que são como fantasmas, muitas vezes criados apenas para o terror, para a mentira, para espalhar o ódio.

É junho. Sabia de uma coisa? Eu não sabia. Junho sempre tem chuva de meteoros. Nenhum mês começa no mesmo dia da semana que junho em qualquer ano. E todos os anos termina no mesmo dia da semana que termina março. Começa no mesmo dia que fevereiro do ano que vem. Nele, a floração das rosas atinge seu máximo e junho já foi chamado de Rosa Lua. Não faz diferença, não muda nossa vida, mas é leve.

Aqui, comemoramos três populares santos: Santo Antônio, São Pedro, São João. Vamos ver bandeirinhas coloridas espalhadas, vai ter quentão, danças de roda e a quadrilha, mas a boa, aquela que nos junta batendo palmas, cantando, dançando, tentando nos embriagar para esquecer que, como já disse, repito: aiaiai, quanto mais a gente reza, mais o nosso coração sofre com as notícias que chegam de todos os lados, uma sobrepujando a outra, como se todas elas fossem naturais e devêssemos apenas seguir em frente .

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Marli - perfil cgMARLI GONÇALVES – Jornalista, consultora de comunicação, editora do Chumbo Gordo, autora de Feminismo no Cotidiano – Bom para mulheres. E para homens também, pela Editora Contexto.  (Na Editora e na Amazon). marligo@uol.com.br / marli@brickmann.com.br

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ARTIGO – Fogueiras de junho. Por Marli Gonçalves

3844452_bu2M0Ô coisa boa quando chegava esse mês e tinha aquelas festas de rua, de vila, cheias de bandeirinhas coloridas, comida boa, e prendas para ganhar. Quadrilha era o que se dançava, e a sua formação era divertida, ser noiva, noivo, padre, seus personagens principais. dancarina29

E quando se ouvia a narração olha a cobra, era hora de dar volteio, fugir, girando ao contrário. Olha a chuva, saudação. Pau de sebo, desafio. Correio elegante fazia corar.

Hoje, olha a cobra nos lembra jararaca, a que queremos enquadrar como origem da decadência. A quadrilha dança, mas miudinho, com as mãos para trás. A chuva leva ou lava. E o padre foi substituído por um juiz, o único que casa noiva com noiva, noivo com noivo, dentro da lei, e que ora determina ultimamente o tamanho da fogueira, que altura ela vai arder.

A música caipira agora está mais por cima da carne seca, e até o caipira nem é mais aquele, nem aqui, nem na quermesse da esquina. São João, Santo Antonio, São Pedro ouvem o estouro de muitas bombinhas do armamento completo dessa época, que tem de biriba a foguete. Se for do crime organizado é escopeta, lança-chamas, AR-15. E nem digo atrás de quem está correndo o busca-pé. É bomba todo dia no falatório deitado em algum depoimento ou captado em gravação depois de beber muito poncho, sangria, quentão, ou só bons vinhos ou chocolates trazidos da Suíça quando daquela viagem que agora sabe-se o que é que tanto se perdeu lá pelos Alpes.

Não é brincadeira, no entanto, o que passamos nas festas deste ano, e nem precisamos girar muito para ver que estamos tentando colar o rabo no burro, de olhos vendados. E pulando muito na corrida dos sacos, se fazendo de saci, tentando sim é pescar alguma coisa para levar para casa, milho para alimentar a família, arrastando o pé na terra por aí atrás de emprego, pagar contas, não perder o pouco que juntou no arraial.

Podia ser pajelança minha proposta de pegarmos uns papeizinhos para escrever o que desejamos queimar na fogueira, mas melhor que seja na pureza do correio elegante, dos jogos de prendas, a começar do imobilismo nacional boca aberta diariamente com a direção que o vento toca inflamando impressionante o fogo.

festa-juninaTipo a barraca do beijo que sempre foi bem concorrida. Podíamos pagar, embora já o façamos indiretamente para nos vermos livres de um monte e de suas armadilhas e interesses menores, suas declarações impróprias como se burros fôssemos mesmo para aceitá-las. As jogadas ensaiadas que praticam, como se tivéssemos o mais precioso, o tempo. E esse aí que está sendo implacável, nos rebaixando em tudo quanto é nota, ranking, como um abismo profundo que nunca desejamos com nosso espírito alegre, matreiro como a garota de sardas e maria Chiquinha.

Tenho sentido muita dificuldade até de expressão, de ânimo, para comunicar o que sinto, penso ou acho diante do que me informam e apresentam, acontece, percebo. Para o quê? Para quem? Que vantagem “Maria” leva? Quem se importa?

Às vezes, muitas vezes, me sinto sem lugar nesses dois planetas estranhos que orbitam ao nosso redor numa dancinha chata e inconsequente, até “caipira”, mas no sentido de comparação com o mundo moderno que já deveria estar se descortinando, mas que assinala nossos ambientes muito hostis, cada vez mais. Não é mão de direção, não é esquerda, direita, contramão. Deveria ser passagem livre.

Olha o caminho da roça! Olha a chuva! É mentira! Olha a cobra! É mentira! A ponte caiu! É mentira! Olha o pai da noiva! É mentira! Preparar para o grande túnel!
É tudo quadrilha. É verdade! Tem culpado que assobia! É verdade!

fogueira1

Marli Gonçalves, jornalista “O céu é tão lindo e a noite é tão boa. São João, São João! – Acende a fogueira no meu coração”.

São Paulo, meio do ano e tudo indefinido, 2016

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Hoje, dia de Santo Antonio.E lá fui eu falar um pouco disso tudo, de Brasil, na Rádio Trianon AM

Amigos, vocês sabem que sempre que vou até ali aprontar alguma trago umas imagens para vocês aproveitarem, nem que seja de relance.
Hoje fui à Radio Trianon, bater um papo em uma entrevista com o adorável Assis Ângelo no O BRASIL ESTÁ NA MODA ( TODOS OS DIAS, ÀS 14H30)

AÍ FIZ UNS TAKES…

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E UNS FILMINHOS, SÓ PARA TE DAR O CLIMA. VIVA SANTO ANTONIO!