ARTIGO – Tá tenso. Tá, sim, senhoras e senhores. Por Marli Gonçalves

Tá tenso aí? Tem até rolado uns medos mais esquisitos? Anda olhando para os lados, já não atende celular na rua nem por decreto? Anda de carro com os vidros fechados ou, se tem recursos, mandou fazer blindagem dupla? Se arrepia só pela aproximação de uma moto ou uma bicicleta?

TENSO

Está tenso. A impressão não é só minha ou sua, parece ter mesmo a ver com o clima geral. Pior, clima local, nacional, mundial. Parece que estamos todos dentro de um barril de pólvora e que se alguém riscar um fósforo pode explodir, e ainda bem que não estamos perto de rebanhos bovinos e seus puns inflamáveis que mandam tudo aos ares.

Mas vamos falar de Brasil. E, ainda, mais perto, também de São Paulo que acaba representando o que deve estar ocorrendo em outras centros urbanos, embora em outra escala. Parece que alguma coisa está sempre sendo urdida em algum lugar – isso aqui me referindo à política, a aquele pessoal horroroso que nos infernizou durante quatro anos e que não queria largar o osso e agora pretendem não nos deixar esquecê-los de vez. A gente respira um incrível e silencioso ar de conspiração, que nos impede até de curtir um pouco mais o ar pacífico, alegre e leve que sentimos quando os tiramos do poder. Eles insistem em infernizar e o ar chega a ficar fétido quando o atual governo federal não faz ou faz/ fala/ inventa sandices, infelizmente ocasiões que ainda são numerosas. Imediatamente qualquer assunto, por mais bobo que seja, é ampliado pelos agentes do mal nas redes, fermentado, acrescido ainda de fake news e outras provocações. Eles estão aí, vivos, que não nos distraiamos.

A economia não vai bem no mundo inteiro, mas claro que o que a gente sente mesmo de verdade na pele é a nossa, a que está perto, a que nos impede de comprar, planejar. E não tem nada bom, os índices mostram que um rolo compressor aparenta estar aquecendo motores atrás de algum poste, empresários mal humorados, demissões assustadoras, previsões de tempo ruim. Tudo isso também dimensionado e alimentado pela ideia do quanto pior melhor, da direita, da esquerda, do centro – assim se fatura em cima, vocês sabem que essa é a comida da política ruim.

Vou fechar o foco mais aqui em São Paulo e aí vamos falar de Segurança Pública, do Centro da cidade, dos moradores de rua, dos viciados da Cracolândia, das ondas altas de volta, com sequestros, roubos, assaltos, golpes de tudo quanto é tipo, gangues, da pedrada, da cotovelada. Tudo coisa pra a gente até ter saudade dos tempos que falávamos apenas de trombadinhas. Agora são trombadões sem qualquer poesia que nos lembre os meninos do trapiche de Jorge Amado em “Capitães da Areia”.

É preciso também, no entanto, que se ressalte: o número de ideias de jerico que está saindo da cabeça das autoridades responsáveis parece que vem de contusões de tanto eles próximos baterem cabeça entre si. Essa semana foi pródiga. A começar pelo projeto de levar moradores de rua para trabalhar em propriedades rurais de pequenos agricultores, com o governo se comprometendo a comprar deles parte da produção.  Não parece uma ideia linda, fofa?

Pois, pelo menos a mim, parece a implantação de um projeto de nova forma de escravidão, porque obviamente a fiscalização do funcionamento é praticamente impossível.

Todo dia uma coletiva anuncia algo: então, já cercaram de grades a icônica Praça da Sé; a bela Catedral está com a sua frente adornada por viaturas. Como espalharam a Cracolândia, boa parte dos efetivos se ocupa em passar o dia correndo atrás dos montinhos de viciados e traficantes que se agrupam, correndo e voltando sempre ao mesmo local quando eles viram as costas. Sobre os moradores de rua, enquanto um secretário dá entrevista falando em tratamento humanizado, poucos quilômetros adiante as câmeras das tevê mostram barracas e itens do povo da rua sendo jogados violentamente em caminhões. Têm sido frequentes os relatos de truculência policial.

Tá tenso, bem tenso, porque tudo isso junto está piorando nos últimos dias quanto até o comércio já bem prejudicado tem baixado portas para evitar arrastões que já ocorreram na região central. O medo, o temor e o terror se espalham. Mas fiquem espertos. A diferença é que agora tudo parece muito organizado, comandado de cima por poderosas forças e organizações criminosas que se fortaleceram cada vez mais justamente nos últimos anos enquanto quem devia agir continua pensando em soluções que nunca chegam. Ou quando são tentadas são só mais ideias de jerico.

___________________________________________________MARLI CG ABRIL

MARLI GONÇALVES – Jornalista, consultora de comunicação, editora do Chumbo Gordo, autora de Feminismo no Cotidiano – Bom para mulheres. E para homens também, pela Editora Contexto.  (Na Editora e na Amazon).

marligo@uol.com.br / marli@brickmann.com.br

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ARTIGO – Deus-dará. Por Marli Gonçalves

DEUS-DARÁ

MARLI GONÇALVES

Ao deus-dará, a deus-dará, o deus-dará. Deus-dará? As formas são variadas, todas corretas, mas a verdade verdadeira é que estamos na mão, largados, ao acaso, à própria sorte, e que a situação chegou a um ponto tal que é o que pode explicar não só a eleição de Jair Bolsonaro com seu slogan recheado de Deus, mas a fé ardorosa com a qual as pessoas acreditam que solucionará tudo como se fosse o próprio.

Você viu ou alguém deve ter comentado com você. Luz do dia, Bairro do Brás, São Paulo, Capital, um grupo ataca impiedosamente no meio do aglomerado de pessoas fazendo compras em um dos principais centros populares, milhares de pessoas todos os dias, todas as horas. Agem em conjunto, como hienas. Gravata em um, arrancam tudo que podem, jogam outro no chão, levam celulares, arrancam a corrente de mais um. Saem tranquilos, se dissipam e voltam a se reunir em minutos. Enchem de porradas e roubam um homem que, desnorteado, vai falar com dois policiais que passam ali no momento, numa rotina modorrenta, como se nada estivesse acontecendo. Eles, os policiais, não param nem para ouvi-lo. O homem fica ali falando sozinho. Foi gravado. Passou no principal noticiário de tevê.

Avenida Paulista, domingo, fechada aos carros, milhares de pessoas passando, passeando. No principal cruzamento, da Rua Augusta com a Avenida, calçada com o chão loteado por hippies (sim, ainda existem, exatamente iguais, apenas mais cabeludos, rastafaris e bem estranhos e agressivos) com seus artesanatos e costumes de sempre. Um grupo deles estende de qualquer jeito uma madeira próxima ao fio da calçada, joga carnes, linguiças e ali faz um churrasco bem fumacento sem a menor cerimônia. Parados na frente dessa cena, um grupo de fiscais vê e nada faz; um grupo de policiais vê e nada faz. Os policiais ainda respondem, ao ser inquiridos, que nada fariam por medo da “reação” da população. Tá gravado. Por mim, inclusive. Filmei, porque se me contassem que era normal fazer churrasquinho desse jeito, na Avenida Paulista, não acreditaria. Ah, os policiais também não se moveram quando o grupo tentou me intimidar enquanto registrava a cena.

Na esquina de um dos locais mais caros e “elegantes” de São Paulo, Jardins, o restaurante não se faz de rogado: pegou um tapete, sim, um tapetinho, e estendeu sobre a calçada – sobre, repito, tampando – o bueiro que está ali para o escoamento da água. Uai, para eles, qual é o problema?

Na mesma região os pés das árvores viram lixeiras com sacos e sacos de lixo, detritos de toda ordem, saquinhos com cocô de cachorro (adianta catar sem dar destinação?), madeiras, vassouras, caixas, tudo bem socadinho. Pode ter um poste do lado, mas o povo acha legal botar tudo nas árvores, e ainda olham feio quando se chama a atenção para o absurdo do ato. Depois ninguém entende porque qualquer garoa derruba dezenas de árvores por aqui. Com minha campanha particular – #árvoreNãoéLixeira – pelo menos duas ou três salvamos. Mas é um stress.

Digo daqui: São Paulo está ao deus-dará. Imagino que não esteja diferente o resto do país. Falo dos lugares por onde passamos diariamente, onde vivemos, e dos direitos básicos pelos quais pagamos impostos caros. Viadutos despencam, crateras abertas nas ruas, assaltantes agindo à luz do dia, calçadas esburacadas, que cada um faz como quer, criando montanhas-russas. Acessibilidade? Não me faça rir.

Leis não servem. Exemplo, a do telemarketing que é proibido, piriri pororó. Quantos telefonemas você já recebeu só hoje? Onde conseguiram seu número, seu nome? Não adianta tentar se livrar deles, agora também mandam incessantes mensagens para os celulares.

Conhecei a verdade e a verdade vos libertará. Frase que ultimamente temos ouvido frequentemente. A verdade, então, seja dita: estamos ao deus-dará. Como – e quando – vamos nos libertar da incompetência?

Deus dará conta? Já estão pondo na conta dele o país inteiro.

#arvorenaoelixeira

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Marli Gonçalves, jornalista – Não adianta reclamar nem pro policial, nem pro bispo, nem pro Papa. Muito menos para as autoridades.

marligo@uol.com.br / marli@brickmann.com.br

Brasil, ano após ano.

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ARTIGO – 60, por hora, na vida. Por Marli Gonçalves

Acordei e era idosa. Sentei na cama, movi os braços, as pernas. Corri para o espelho. Chequei se continuava tudo ali no lugar, forcei um pensamento mais arrojado e tudo bem, valeu, pelo menos a meu ver, ele surgiu coerente e livre. Ufa! Tudo bem, tudo legal. Na noite anterior, coisa de um minuto para outro eu tinha pulado de fase no jogo da vida, chegando à casinha 60, aquela na qual é preciso parar um pouco, pensar e esperar quais serão as próximas jogadas.

Tudo igual. Que bom. Agora ganhei um epíteto a mais: idosa. Se provocar, tem mais: sexagenária; sessentona – palavra que pesa um pouco nas costas, principalmente as femininas. Os sessentões parecem mais galãs. As sessentonas, quando citadas, dão a entender que são espevitadas e pouco virtuosas. Usada como adjetivo aponta ironia com a informação que dará em seguida “Sessentona isso, sessentona aquilo, sessentona apresenta namorado trinta anos anos mais novo”…

Tem o coroa também, meio gíria antiga, que um dia alguém me explica. É usado para definir qualquer pessoa que seja mais velha do que quem a declama. “É uma coroa enxuta”, uma frase, por exemplo.

Engraçado, ainda bem que me preparei antes, buscando não ter muita ansiedade, meditando bastante e observando como pode funcionar para mim e para os outros. Do meu canto, me observo e observo. Consigo agora até tocar no assunto por aqui.

O redondo 60 é número bonito, sonoro, imponente e importante. Deve ter algo a mais para oferecer. Tanto que horas têm 60 minutos e os minutos, 60 segundos. Dizem que 60 era o número mais admirado pelos babilônios, que dividiam o círculo em 60 partes, e que foi assim a base na qual estabeleceram o calendário, e calcularam os tais 60 minutos da hora e 60 segundos do minuto. Achavam o número harmônico. Tem o número. 60. A palavra. Sessenta. Sixty, que tem som sexy. Soixante, em francês. Perde um “s” em espanhol, vira sesenta.

Dizem que não pareço que tenho sessenta; tem quem ache que eu não devia nem falar, mas nunca menti. Acho legal. Então até já me organizei para tirar a tal documentação que comprove onde eu precisar que agora, de um dia para o outro, ganhei uns direitos, uns descontos, mereço um outro tipo de tolerância obrigatória e até umas leis de proteção, o tal estatuto. Um lugar diferente nas filas. Vou procurar direitinho o que mais posso ter de vantagem. Porque as desvantagens já conheço e estou vendo não é de hoje nessa sociedade que pouco valoriza a experiência, e nos torna invisíveis.

Estamos aí com força total. Como o tempo passa. Outro dia eu tinha nascido, no outro cresci, fui adolescente e sempre mulher. Nenhuma das fases tão marcada a ferro e fogo como esta. O que foi bom porque carreguei e mantenho as outras partes: ainda sou criança, adolescente, adulta, vivi e agora – como determinam – sou idosa, essa fase marcada com um círculo em volta. Tô brincando com isso com meus amigos e amigas. Ouvi muitas gargalhadas e, dos que já passaram dos 70 e quase já chegam ao 80, ouço dizem: esse é um novo começo. E é neles que me fio. Afinal, quando nasci eles já eram até maiores de idade.

Adoro saber do ano de 1958, e me vejo como um acontecimento igual a muitos daquele tempo onde tudo parecia abrir um novo caminho para o país, para as ideias, arejando ideais, e com grande criatividade artística. Creio que foi um ano bem alto astral. Mais alguns anos que se seguiram também, até que apagaram a luz por 21 anos.

60 anos depois, cá estamos nós, e esse ano agora caminha carrancudo. Valeu a pena? Olho para trás e me preocupo muito é se vou ter energia e vontade de novamente lutar enfileirada para que não consigam fazer desandar de novo o tempo que conquistamos e que se perde. Combater chatos e caretas, e outros tantos que pensam torto, e querem regredir ainda mais.

Uma preguiça imensa aparece do nada. E sei que é uma sensação que invade muitos de nós, hoje idosos, e alguns ainda mais idosos –  que não deve demorar a surgir classificação posterior, já que estamos vivendo mais. Os idosos e os mais idosos, todos por aí com muita energia, superando a garotada que parece já ter nascido cansada e isolada em suas redes sociais.

Temos visto terríveis casos de suicídios, de pessoas famosas que aparentavam ser totalmente realizadas. Penso que talvez elas tenham querido apenas congelar o tempo. Porque sempre há o medo, muito medo,  do que virá.

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 Marli Gonçalves, jornalista – Tá bom, admito, esperei 48 horas para só depois escrever tudo isso. Queria ter certeza do que é que podia ter mudado de um dia para o outro.

São Paulo, junho de 2018

                                               marli@brickmann.com.br e marligo@uol.com.br

 

 

 

 

 

 

ARTIGO – Chacoalhada geral. Por Marli Gonçalves

 Ainda está aí sentindo o tremor, não é mesmo? Viu? Percebeu o quão tênues e surpreendentes estão as linhas, os limites, os acontecimentos? Não dá para se acomodar, que tem muito pó-de-mico na cadeira. É hora séria, de a gente pensar juntos qual estrada pegaremos sem bloqueios. E sem bloquear a liberdade

Não foi no primeiro dia, mas lá pelo terceiro a coisa começou a ficar bem feia e então todos percebemos que estávamos parados ou parando nas encruzilhadas e nas quebradas, e que as cidades viraram ilhas. O governo demorou mais do que nós, porque lá onde vivem é uma espécie de Olimpo, e só quando baixaram na Terra é que perceberam que aqui estávamos no Inferno, abaixo dela, terra, alguns dedos, se é que me entendem.

Pagamos uma tal de Inteligência, uma agência inteira, a ABIN, que só serve para nos atazanar, porque ajudar que é bom…Mas nem precisava, porque soubemos também que há mais de ano havia essa ameaça de greve exposta em cartinhas dessa categoria carga pesada – ou melhor, de todas as cargas – e os ouvidos continuaram moucos.

E aí juntou tudo, patrões, empregados, gasolina com preço fervendo, diesel com sangue azul. De tudo que reivindicaram, realmente houve uma coisa que chamou a atenção: não vimos ninguém pedindo na listinha que fizessem melhorias no lugar onde andam, e nós também, propriamente, as estradas, que são a bagaceira em forma de asfalto ruim e terra enlameada. Caminhos que gastam mais combustível, energia, vida, os caminhões, treminhões, pneus, levam vidas. Estranho. Muito estranho também não terem listado outro aspecto: segurança. Isso com tantos assaltos e roubos de carga, cotidianos.

Talvez essas cobranças sobrem agora para nós fazermos, ou numa eventual greve geral que já não acho tão impossível, ou na plataforma dos candidatos que estão aí e que ainda parecem flanar sobre nossas cabeças e problemas.

Assim, precisaremos fazer nossas listas de reivindicações – urgente. Podemos também começar reclamando do absurdo preço da gasolina, mas enquanto maioria devemos nos preocupar muito em exigir transportes públicos de qualidade e vias alternativas de escoagem de produtos de primeira necessidade, como ferrovias. Esses dias todo mundo lembrou do “trem bão”.

Senão, nada impedirá que novamente sejamos chacoalhados e fiquemos pendurados em alguma brocha como essa que pintou o sete nos hospitais, mercados, linhas de produção.

Foram momentos nos quais não soubemos de tiroteios nem de balas perdidas no Rio de Janeiro; da febre amarela, dengue, e do absurdo das campanhas contra vacinas feitas por ignorantes. Talvez esses e outros tipos de ignorantes estivessem preocupados em sacudir bandeiras desajeitadas pró uma intervenção que eles não têm noção do que é, do que poderia ser, do que foi quando ela aconteceu e nos chacoalhou, bloqueou e feriu por 21 anos.

Aprendemos muito observando esses dias. Vimos o medo, a loucura, a ganância e o egoísmo em suas piores formas, o descontrole e o exagero. O corre-corre desnecessário. Cada um por si, ninguém por todos. Um país inteiro de joelhos, cada um rezando um credo.

Ficamos com o bumbum na janela. E dela avistávamos as ruas vazias, sem trânsito, muita gente andando, muitas bicicletas enfim ocupando as ciclovias, e sentimos o estranho (mas muito bom) silêncio. Poluição pela metade. Incrível como tudo pode ter um lado bom.

Mas mais do que tudo isso, sentimos o tremor e o temor. Externamos nossas preocupações com o futuro, com o que aconteceria, e com o que pode acontecer. Fomos pegos num redemoinho, e ainda estamos bem tontos.

Esperamos soluções, e que não são soluços grandes de um choro que não queremos mais ter. Muito menos por estarmos engasgados com tantas coisas para dizer.

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Marli Gonçalves, jornalista – Vivendo um momento de transição etária nesse momento e que lembra quantos anos rodados de estrada. E a tristeza por todos que foram ou já estão parando nos acostamentos. Saindo literalmente para fora do caminho.

marligo@uol.com.br /marli@brickmann.com.br

São Paulo, beliscada, junho de 2018

ARTIGO – Barata voa, zaralho. Por Marli Gonçalves

 

Animated%20Gif%20Children%20(19)Somos parte de joguinhos infantis, mas não entramos no playground porque estão cobrando muito caro e a gente está duro. Assistimos. Vemos as águas rolarem ou secarem, um querendo dar estilingada no outro, dando rasteira, pondo o pé pro outro cair, um dando o dedo mindinho pro outro naquele sinal de descruzar, rompendo amizade e virando a cara. Até ficaríamos nos divertindo com os patetas, mas somos atingidos pelas molecagens deles. A bola que toda hora chutam – e como chutam! – vai bater justamente nas nossas cabeças. Barata voa, zaralho.

Esse é o nosso cotidiano. Todo dia ela faz tudo sempre igual. Fica irritada, bate o pé. Se resolve falar, o que emite são frases entrecortadas e sem sentido, nunca um mínimo de direção. Faz uma cara que tenta ser de boa, “a calma”, “a democrática”, mas é indisfarçável aquele ódio todo fervendo por dentro. Ela odeia a gente. Diz que é vítima da sociedade cruel, incompreensiva.

children_sledA premissa que uma equipe deva ser e funcionar como uma orquestra decididamente não se aplica à política executada pela nossa presidente maestrina (aqui tem feminino específico como a senhora gosta) e seus tocadores de bumbo para louco bater, que dia após dia perdem mais um naco de suas capacidades e argumentações para defender o que nem mais eles sabem o quê. Não tem conjunto essa obra. Nem do ponto de vista social nem econômico, nem ético, nem de cidadania, muito menos de pessoalidade, afeição, consideração. Entendem? Parecem crianças de famílias diferentes jogadas no playground de uma creche para ficar juntas, obrigadas senão levam palmadas, realmente se divertindo só com joguinhos banais, sob o comando de uma bedel rabugenta. Passa-anel, telefone sem fio, batata quente, jogo da velha… Essas pestinhas ficam grudando chiclete no cabelo. Riscando parede e leis. Pondo prego na cadeira. Brincando de pique-pique e esconde-esconde.

Como poderiam se dar bem, pensar juntos, se mal se conhecem, quase nenhuma afinidade têm, a não ser alguma utopia de governo popular de uns e o adesismo descarado de outros? Como poderiam conviver bem, se todos querem beber o sangue dos pescoços, além do nosso, aqui do lado de fora? Criancinhas se borrando todas, como o próprio presidente do partido oficial declarou sobre o governo ser e estar o que há dentro de fraldas sujas.

Todo dia a gente de manhã abre a cortina e encontra ou é informado de uma novidade pior e mais cabeluda que a outra. Cineminha, com fotografias, vídeos reveladores, gravações, enredos elaborados, participação de atores mais do que especiais e suas famílias. Repare só quantas famílias estão embrulhadas nesses casos recentes. Pai e filho. Marido e Mulher. Filhas. Genros. Padrasto ou madrasta ainda não vi. Laranjas, limões e limonadas no café. Com bolachas. E leite mamado de alguma vaca disposta por grana, e nada de grama.

Esse é membro do governo

Barata-voa. Barata voa sim. Esse é o clima. Mas quem está gritando de nojo delas somos nós. Andei achando por aí um dicionário especial de gírias que define bem o sentido de barata-voa. Só que me apavorei porque ele é da linguagem militar. Para eles, barata-voa que dizer ação desordenada e desorganizada, bagunça, agitação, ou um zaralho, a palavra que parece a mais expressiva que encontrei, sonora e visualmente, que parece xingamento e não é, para o resumo do momento atual. Zaralho. Que é o mesmo que farândula. Que no fim também é Zorra Total.

Virou uma comédia. Mas nós não podemos mais rir. Muito menos de boca aberta para barata entrar. Ou cobras e lagartos saírem quando resolvermos abrir a boca para reagir de verdade.Adam-Eve-Snake-64548

São Paulo, chocando ovos de serpente, 2015coelho

Marli Gonçalves é jornalista – – Nessa semana vão falar da desgraçada gloriosa, vão brincar de bate-parede na vênus platinada, vão tentar se explicar. Também tentarão nos dissipar. Mas precisamos ser como nuvens, não de gafanhotos, mas de vagalumes, todos com lanternas acesas para iluminar a noite e um novo caminho.

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ARTIGO – STRESS COM STRASS. Por Marli Gonçalves

 

  Antes eram de strass as pedras cintilantes que nos enfeitavam as fantasias. Nesse ano parecem ser é de stress as fantasias que usaremos no Carnaval, se é que ainda dá para ter alguma, e se é que teremos eixos nos carros alegóricos. Com plumas e penas voando pra tudo quanto é lado, fazendo-nos ver direitinho aquelas estrelas…

Stress total. No lugar de confete, bombas de efeito moral. No lugar do lança-perfume, e do cheirinho da loló, gás pimenta. Ao invés de estandartes, armas e cartazes de protesto. Não é mais caso de samba no pé, mas de “dar no pé”. Nem vou contar o medo que dá imaginar onde podem ir parar as plumas, se não forem apaziguados os ânimos desse povo que trabalha fantasiado, principalmente os vestidos de polícia e de bombeiro. Botar o bloco na rua de algumas cidades brasileiras está ficando cada vez mais difícil, e vejam que não estou só falando exatamente da tal folia de Momo, festa pagã, nem de pular quatro dias sem parar.

Estamos pulando todos os dias. Miudinho. Com os nervos à flor da pele, e desafinando na harmonia. As cidades estão enlouquecendo em série e tudo o que não foi feito, não foi planejado, não foi resolvido, está se voltando contra seus criadores. É prédio caindo. Chuva caindo. Árvores caindo. Postes caindo. Ponte partindo. Só não cai a ficha de que precisamos buscar já a solução. Só não se parte a cara de pau dos governantes que se alternam, pendendo ora para um lado, ora para outro – dependendo da situação. E da oposição.

Calor demais, avenidas e estradas derretendo. Começa a haver uma saturação e tanto de toda sorte de problemas, e que não são novos. Chuva cai todos os anos, e também no verão. Mas está fazendo muitos mais estragos nos remendos, levando o que resistiu até agora. Greves? Tem todo ano, por melhorias salariais que nunca chegam. Os reis Momo vão empurrando tudo com a barriga pelas avenidas afora e nós, meros passistas, passivos, zumbis como em clipes do Michael Jackson, fantasiados de “otários-mor”, “pagadores de impostos”, “bloco dos desiludidos”.

Nós, os que moramos nas grandes cidades, se quisermos continuar nessa, vamos ter que nos sacudir e enfrentar. Novos desafios estão sendo postos, e é hora de deixar de dizer que isso é problema de “alguém”. Daqui a pouco haverá uma grande reunião mundial, a Rio+ 20 e, a hora que forem fazer o balanço do que foi que fizemos desde a Eco-92, vamos ficar com as caras de tacho que Deus nos deu.

Vamos escrever tratados e tratados, cartas de intenções, assinaremos moções. Vamos babar muito ovo para o montão de especialistas. Levaremos os gringos até as quadras das escolas para eles verem nossas belezas naturais e, depois, nos despediremos deles com lencinhos brancos acenando da janela dos nossos aeroportos vagabundos, e agora nas mãos de grandes administradores, famosíssimos, da África e da Argentina. Compreendam: foi amor de salão. Os encontramos e “concedemos”, escutem bem – con-ce-de-mos – nossas benesses no promovido baile do leilão da bacia das almas. O bailão do governão.

O que também trava tudo é essa cada dia mais chata dicotomia entre dois tipos de poder, como se só dois tipos houvesse, um com plumas, bico grande; outros, “estrelas” que não brilham mais nem no firmamento da casa deles, tão perdidos em gostar e se lambuzar das benesses de poder. Se sou eu que faço, não é bom, porque não foi você, acha ruim. E vice-versa. Já ouviram, claro, falar na famosa “pimenta na bbb…boca dos outros”, decerto. Um diz o que não disse, outro esquece o que falou ou escreveu.

E, se antes nessa época tinha a feijoada amiga, agora é o fogo amigo que entorna o caldo sem cachaça. Até a loira metida à besta está de novo no ar fazendo ondinha com a boca, batendo sapatinho, sem querer acordar de mão dada com quem nunca dormiria com ela. Birrenta.

Gostei mesmo foi dessa ministra nova que chegou para a secretaria de Políticas para a Mulher. Já chegou dizendo tudo, levantando a poeira. Gosta de homem, de mulher, tem filha gay, já fez dois abortos assumidos, feminista. Se não é bonita, bem, quem é? A outra, ministra de narizinho arrebitado, parece mais estafeta da generala. E tenho pavor daquela outra que assumiu a Petrobras, fazendo força para parecer mais feia e rude do que já o é.

Ninguém mais precisa de máscaras a essa altura.

São Paulo, na avenida, com um monte de candidatos amontoados, sendo que alguns estão gostando, creio, exatamente desta posição, 2012.(*) Marli Gonçalves é jornalista. Acredita que, se não pensarmos rapidamente no nosso entorno – rua, vila, bairro, cidade -, vai ser bem difícil fazer o país. Sem base, tudo rui. Nas nossas barbas.

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