ARTIGO – Estamos numa fria. Por Marli Gonçalves

Entramos e estamos numa boa fria, numa gelada, num enorme saco sem fundo. É tanta coisa acontecendo de esquisito, de ruim, e sem que possamos resolver de vez ou tomar medidas rápidas e objetivas – a solução não está só em nossas mãos, mas na de todos e em tantas mudanças e acertos – que só resta, sei lá, espirrar. Espirrar com muitos desses culpados de nossa frente

Saltos, piruetas, manobras espetaculares no asfalto, nos tatames, no mar, fôlego na piscina; as mulheres arrasando, a garotinha em cima do skate, a outra bailando com movimentos precisos bem na cara de suas próprias dificuldades. Orgulho, vitórias, e não só, também as derrotas, trouxeram distração para mais de 100 metros nas notícias e madrugadas olímpicas. Vimos novamente, felizes – mesmo que por instantes – a bandeira nacional tremulando sem que ela nos causasse essa certa repulsa que tanto fizeram que conseguiram nos fazer dela até enjoar nos últimos tempos.

Soubemos das incríveis lutas e histórias de superação dos atletas – os vimos felizes e também desolados quando ficaram pelo caminho em suas modalidades. Pelo menos ali acompanhamos um país se esforçando, lutando para se firmar e melhorar. Temos mais alguns dias para acompanhá-los e torcer.

Mas agosto está aí, sempre teremos agosto. E já está vindo embalado pela pandemia que continua matando muito mais de mil pessoas por dia e querem que isso pareça normal, quando vemos outros países indo e voltando de medidas restritivas nesse vaivém estonteante. Aqui, o pimpão prefeito do Rio de Janeiro, por exemplo, decretou que vai estar tudo bem até o outro mês e até já marcou feriado e festa. Uma vergonhosa corrida de Estado contra Estado, cada um querendo parecer melhor que outro, em campanha aberta, como se não bastasse o furdunço que virou o Governo Federal.

Às vezes acho que a água que os dirigentes e responsáveis pela condução do país tomam contém mesmo alguma coisa a mais – só pode ser. Não atingimos ainda nem os 20% de imunizados com as duas doses. Há ainda um inacreditável número de pessoas contrárias às vacinas ou que não voltaram para a segunda dose, quando necessária, como o é para a maioria. Ainda vemos quem tenta escolher qual marca tomar – e muitos desses estão tombando pelo caminho. O Ministro da Saúde ousa proclamar vitória e ações do governo, como se não tivéssemos já quase 560 mil mortos e mais de um ano e meio de pandemia muito mais cruel por causa dos erros deles.

Agora, as aulas vão voltar – e não se tem a menor ideia de como resolveremos os sérios problemas da Educação, da evasão, do atraso no ensino. O Ministério? Além de uma fala maluca do ministro, outro batendo no peito por feitos não feitos, pôs no ar uns anúncios moderninhos. Volta também o showzinho diário da CPI que, quando acabar, teremos um relatório enorme, e precisaremos torcer muito é para que ele não vá dormir em alguma gaveta.

Quem chacoalhou esse país para ele estar assim tão dividido? Quem abriu a tampa do bueiro para tantas absurdas ignorâncias? Um queima o Borba Gato; outros vêm e jogam tinta vermelha nas homenagens a Marighella e Marielle. O fogo queima nossa memória. As mentiras e notícias falsas se espalham e ecoam. O presidente monta um circo para dizer o que já sabíamos de suas acusações sobre as eleições – que ele não sabe de nada, não prova nada e isso é só mais um assunto para manter o percentual cada vez mais baixo de quem o segue, ainda achando que ele presta, mesmo vendendo seu mísero poder para outros míseros carrapatos que grudam em tudo que é governo, seja de qualquer lado do colchão. Não adianta virar, desvirar, por ao Sol.

É inverno e até o frio intenso e recorde que há muito não aparecia ataca o Sul e o Sudeste, expondo nosso total despreparo para qualquer situação extrema e a miséria que grassa nas ruas que acomodam friamente mais milhares de recém-chegados. Os preços disparam, sem controle, enquanto turistas fazem horrorosos bonequinhos de neve e a geada acaba com as plantações.

Estamos mesmo numa fria na qual entramos sem saber ainda como sair dela, estranhamente escaldados.

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MARLI - cgMARLI GONÇALVES – Jornalista, consultora de comunicação, editora do Chumbo Gordo, autora de Feminismo no Cotidiano – Bom para mulheres. E para homens também, pela Editora Contexto.  (Na Editora e na Amazon). marligo@uol.com.br / marli@brickmann.com.br

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ARTIGO – Sob e sobre ameaças. Por Marli Gonçalves

Vivendo sob constantes ameaças, e que só aumentam, vindas de todos os lados. Não bastassem as lutas para controlar a pandemia, o surgimento de novos vírus e outras doenças esquisitas, os problemas com energia, água, temperatura, economia, no Brasil vivemos mais um pesadelo, o político. Qualquer homenzinho, ou serzinho verde oliva, agora aparece cheio de marra, e ameaçando a democracia.

Ameaças

Temos muitas dúvidas, perguntas, pedidos de esclarecimentos, e temos ouvido quase sempre as mesmas não-respostas. Repara quantas vezes, nós, da imprensa, perguntamos, perguntamos. “Mas até o momento não obtivemos resposta”. Todo dia. As revelações, gravações, denúncias, fatos e fotos, falas e gestos se sucedem.  Parece que estão brincando de governar, e estão; sem rumo. Mas jogam pesadamente pelo poder – e com as nossas vidas.

Para quem já viveu momentos difíceis, apenas uma clareza: antes, sabíamos exatamente o que, quem, como estávamos combatendo ou de quem deveríamos nos defender. Agora, apenas a ignorância grassa e é como se o inimigo morasse ao lado, e possa surgir nos surpreendendo. Os descobrimos entre pessoas próximas, amigos, familiares, numa divisão sem igual. Contaminam todos os ambientes.

Os ataques podem ser tão sub-reptícios que até uma deputada acorda machucada, com fraturas, e sem saber exatamente o que ocorreu denuncia poder ter sofrido um atentado. Muito louco? Não, se pensarmos que agora tudo é mesmo possível, inclusive para quem amigo deles era; e inimigo deles, virou. O que aliás tem sido muito comum: o abandono desse barco que navega sem sentido e em uma tenebrosa maré. Maré obscura, armada, violenta.

Ultimamente, não sei como, descobriram uma palavra que usam para tudo e que duvido saibam exatamente qual o seu sentido: “narrativa”. Escuta só uns minutinhos de CPI. Escuta um minutinho do discurso de justificativas e negações deles. Até o presidente, que não é o maior afeto ao vocabulário humano, outro dia disparou “narrativa” para lá e para cá. Lá vem ela: tudo que os afeta é narrativa incorreta.  Só a deles – e que vem eivada de ódio e erros – é que deveria ser ouvida.  Tentam adestrar com decorebas os seus bovinamente seguidores, pouco importa o que falam, mesmo que logo depois contradigam-se.  O recheio de informações falsas que usam cria uma espécie de hipnotismo, repetições ao molde de treinamento de animais. Contam um conto, aumentam muitos pontos.

Isso não é ideologia, direita, esquerda, volver, nem centro, nem de cima nem de baixo. Para ser ideologia tem de haver inteligência, conhecimento, estudos, lógica, contraposição, debate. Assim a gente descobre porque é tão difícil lidar com eles, são apenas chucros estes que estão no pódio do poder central, ladeados por muitos outros, instalados em outros poderes. Infelizmente, inclusive na imprensa, muitas vezes a pesados soldos.

Agora a questão é duvidar das urnas eletrônicas, pregando o voto impresso, mesmo que se diga e repita a confiança nessa forma de voto. Não deve passar essa iniciativa. Tomara que não. Mas eles inventarão outras ameaças nesses meses que antecedem a eleição do ano que vem, e que infelizmente ainda não nos apresenta uma lista de candidatos fortes o bastante para recolocarem o país nos trilhos.

“Se urnas são confiáveis, dá um tapa na minha cara”, pede Jair Bolsonaro, ao duvidar do próprio sistema eleitoral que o elegeu, sem apresentar provas.  Será que vai ser preciso agendar? Pode entrar quantas vezes na fila?

Ele que está pedindo. Nós não ameaçamos, mas ainda creio que saberemos como nos defender.

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MARLI - cgMARLI GONÇALVES – Jornalista, consultora de comunicação, editora do Chumbo Gordo, autora de Feminismo no Cotidiano – Bom para mulheres. E para homens também, pela Editora Contexto.  (Na Editora e na Amazon). marligo@uol.com.br / marli@brickmann.com.br

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ARTIGO – “Teje” preso! Pode levar. Por Marli Gonçalves

Desonesto, falso, incompetente, despreparado, indeciso, autoritário e pouco inteligente. E muito mais diríamos se nos fosse perguntado, incluindo aí genocida, assassino, atrasado, perigoso e, agora começa a se comprovar, corrupto. Essa semana o sentimento nacional – sobre o perfil do presidente Bolsonaro – ficou mais evidente com o resultado da pesquisa DataFolha. Lava a alma. Desconsideração? Não, apenas a verdade sobre quem nos desconsidera diariamente com insultos, mau gosto, ameaças e impropérios.

forno - teje preso pode levar

“Teje preso”. Pode levar.  A fala do presidente da CPI da Covid, Senador Omar Aziz, ao mandar prender Roberto Dias por não suportar mais, depois de horas novamente ouvindo mentiras de mais um depoente, ainda ressoa. Foi a gota d’água. Já tinham deixado passar um general, o coronel, outros assessores, mas ficou claro que para tudo tem hora. E que ela chega, o que nos dá esperanças de conseguirmos reagir a esse momento que a cada dia fica mais delicado, incerto.

Nada está bem. Tudo muito perigoso, com claras ameaças vindas inclusive de militares bolsonaristas de alta patente, com os quais o presidente se cercou, e que o faz se achar acima de tudo e de todos.

 Há semanas em que a temperatura política atinge a marca da fervura, e a panela transborda. Pois não é que essa semana, enfim, colocaram Bolsonaro na forma para assar, acompanhado por um molho de ministros, militares, assessores, familiares, corrupção pesada, mentiras deslavadas? Não digo que ele tem uma maçã na boca, porque é um ser tão escatológico que dela só saem as piores coisas, bem estamos vendo, mal estamos ouvindo.

O prato está no fogo, mas ninguém consegue dizer qual será o seu sabor, até porque diariamente passa perigosamente do ponto. A carne principal não é de boa qualidade; aliás, é péssima. E os complementos também são de quinta categoria, gente estragada ou pelo passado ou pelo presente, sempre pelos mesmos motivos: poder, corrupção, ganância, despreparo, ignorância. Acenda a luz do forno: o resultado já soma mais de 530 mil mortes de brasileiros, milhares delas evitáveis, fato comprovado por vários cientistas. Se houvesse vacinas, se tivesse havido comando, se não houvesse tanto negacionismo e ignorância, se respeitadas e incentivadas tivessem sido as medidas de proteção e isolamento social. Foram e estão indo embora nossos parentes, amigos, brasileiros que certamente ainda viveriam por um país melhor.

Essa turma que nos desgoverna não merece qualquer condescendência. As pesquisas DataFolha divulgadas essa semana sobre o perfil de Bolsonaro e intenções de voto, mostrando como já é rejeitado por mais da metade da população, descendo a ladeira, esclarece o tamanho da encrenca em que fomos metidos com a sua eleição.

Contudo, já há aglomeração na porta do desembarque, tanto de eleitores arrependidos, quanto de muitos que acharam bonito brincar de política elegendo um capitão naufragado que ousaram erigir como candidato ao maior cargo do país. E eles bem sabiam quem era o tal sujeito. Que não era adequado, nunca foi, nunca seria. Pensaram, talvez, que o controlariam. Mas gente desonesta, falsa, incompetente, despreparada, indecisa, autoritária e pouco inteligente é apenas perigosa. E chegamos a esse estranho momento de retrocesso, ao perigo que o mundo inteiro assiste também assombrado. Que nos envergonha, empobrece, castiga.

Essa semana ouvimos um Basta! mais “redondinho”.  A própria direita agenda protestos para setembro, que eles gostam de ter mais tempo de se arrumar. As provas começam a surgir em dossiês, nos depoimentos, e como o próprio presidente que aparece cada vez mais afoito deve temer, em gravações que surgirão revelando seu conhecimento sobre falcatruas que deixou passar.

Ele está fora de si, mas nós não podemos estar. E, entre as batalhas que devemos travar, está a de impedir a aceitação pelo Congresso da indicação do nome do terrivelmente evangélico André Mendonça para o Supremo Tribunal Federal. Outra, a de impedir que sejamos obrigados ao voto impresso nas eleições do ano que vem, que parecem distantes, mas estão sendo urdidas à luz do dia.

Enfim, impedir todas as ações desta escalada golpista no país que tem fome, e não pode ver acabar a energia, a luz e o gás que ainda lhe resta.

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