ARTIGO – Ria. Você está sendo desgovernado. Por Marli Gonçalves

Que piada de salão que nada! Tudo isso vale meme, paródia, escracho. Trocadilho. No país que é cada vez mais o paraíso dos humoristas ácidos que lidam com a realidade,  difícil discernir o que é anedota do que é verdade, sério ou importante, se é que alguém ainda sabe o que é isso exatamente.  E se fosse só na política…

Bala zunindo pra tudo quanto é lado, o pau comendo em uma das maiores favelas – ops!, comunidades – do país. As paredes esburacadas mostrando o quanto a coisa é antiga. Briga aberta de traficantes, sendo que um deles está a milhares, mi-lha-res, de quilômetros, preso, presinho, trancado, mas com telefone – pasmem – e que funciona, por onde dá ordens.

Você prestou atenção? Você ouviu os assobios das tropas do Exército que desfilavam seu verde só nas redondezas até que alguém os mandasse ir lá ver o Brasil descendo a ladeira?  E os comandantes. Um ousa dizer que está tudo pacificado enquanto a violência faz metástase em bairros nobres do Rio de Janeiro, vizinhos da cidadela. Um outro escreve no Twitter que vai pedir ajuda, o que emputece o ministro que fecha a cara porque quer um oficio timbrado, sabe como é, né, ele é o tal Poder.

Para combinar, tudo isso em plenos dias que o Rio de Janeiro tentava ao menos relaxar com seu Rock in Rio que coincidentemente ao momento alguém resolveu que viraria sigla, RiR. Combinando.  Ô mania que esse país tem por siglas!

Não é por menos que sites como o Sensacionalista e seres como o personagem Joselito Muller estão crescendo e se multiplicando. O país virou piada. Mas os maiores humoristas já estão no poder. E pretendem, parece, continuar com suas piadas de péssimo gosto.

Enquanto isso, a mídia a cada dia dá passos mais largos em direção ao empobrecimento geral da nação. E dando “ibope”. Quer um exemplo? Fácil. Vá aos principais portais e veja quais são os fatos mais lidos, aos borbotões. Pensa que é a situação econômica, a falta de remédios – inclusive básicos – nos postos de saúde, a indigência moral e ética? Não!

Com a ajuda dos personagens que a cada dia abrem mais as pernas e a mente de suas vidas pessoais, e fazem questão de dizer se transaram com um, dois ou três, se era grande ou pequeno, que botaram peito ou tiraram peito, se cortaram ou se deixaram, para não citar fatos ainda mais cretinos, esse virou o mundo atual. Todo mundo querendo ser mais “moderno” do que o outro. Mais avançado, mais arrojado, mais up-to-date, com mais seguidores até no inferno.

Um imbecil, o Roger Moreira, que sempre foi até conhecido por seu QI alto, pau grande como sempre fez questão de informar, e até com alguma anterior qualidade musical, aparece para se ultrajar e apoiar a censura, mexendo com uma artista reconhecida da forma mais chula que vi nos últimos tempos, com desenhinho. Até o pequenino sertanejo Zezé resolve declarar que a ditadura não foi “tão ruim assim”. Que tempos tenebrosos.

Legal ser como sou e como sempre fui para poder escrever isso. Quero ver alguém vir me dizer algo ou me chamar de careta, reacionária. Ultimamente, se reclamo dos governos de araque da última década, tenho sido chamada de esquerdinha, vejam só, o que já me faz rir muito com meus botões e história.

Quer saber? Estou farta de oportunistas que pegam assuntos sérios para se promover e acabar ocultando a total falta de qualidade de seus trabalhos. Na música andam brotando em solo fecundado.  Com o episódio do juiz /cura gay é só procurar, que não foram poucos a tratar da questão como se especialistas fossem, pegando o assunto a unha. No palco do Rock in Rio teve disso, teve Fora Temer com direito a brinco e beijo. Façam atenção: cada vez mais rápido eles chegam e vão. Um Ney Matogrosso que há décadas revoluciona, real, com qualidade e cultura, é coisa rara.

Sim, é fundamental dar visibilidade às causas. Mas a todas. Inclusive ao número de jovens que influenciados por ímpetos andaram se operando, fazendo significativas modificações corporais,  e estão por aí arrependidos. Ou doentes por ingestão descontrolada de hormônios. Ou, ainda, arrependidos de terem desenhado seus corpos com desenhos malfeitos e tintas tóxicas. Ou…

O que é importante não é piada, nem se limita a experiências pessoais de famosos, celebridades e subcelebridades.

Precisamos falar sobre isso. Antes que seja tarde demais. E mais do que 15 minutos.

Marli Gonçalves, jornalista Rir para não chorar.

Brasil, a caminho do 2018

 

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ARTIGO – Calamidade. Por Marli Gonçalves

caldoINJUSTIÇA, INJUSTIÇA! Também quero poder decretar estado de calamidade particular. Existe? Pedir por aí um dinheirinho para pagar umas contas, poder honrar as dívidas no banco, me embelezar e ainda sobrar algum para eu receber bem uns amigos, com certo conforto, e eles já estão chegando… medical_16

 

Por que eles podem e a gente não? Virou tudo mesmo uma casa da Mãe Joana, né? Não vai parar. A capacidade nacional de nos surpreenderem diariamente não se esgota, embora nos deem imenso desgosto. Expõem, sim, mas o esgoto das veias políticas que drenam o desenvolvimento de um tudo que queremos, de um lema que seria, creio, só mais ou menos assim: cresça e deixe crescer.

Mas não. Agora essa última novidade. Que vergonha. Além de arrasar o país com medidas alucinadas, foram lá fora e gastaram uns tubos, buscar um evento do porte das Olimpíadas, e para acontecer logo depois de uma Copa que foi totalmente esquecível, deprimente mesmo. A vantagem que Maria levaria, ou que possivelmente Maria levaria (vai levar?), seria mostrar mais o país, atrair investimentos, gente, turismo, que falassem de nós.

E dar o que falar é nossa especialidade. Conseguimos, sim, que falassem de nós – e muito – até antes de começar o tal grande evento e sua tocha andante: estupro coletivo, tiroteios, balas perdidas, briga de facções, ciclovias de geleia, resgastes cinematográficos, piratas, zikas & Cia, caxumba, gripe. Falta só invasão de ETs. Mais: corrupas de todas as cores e tamanhos, dois governos, líderes de cabelos tingidos de asas da graúna e outros com esposas que arregalam tanto os olhos para grifes que os olhos ficaram assim – arregalados de vez.

Aí um governador (provisório, diga-se de passagem) acorda de manhã, abre a janela, olha para o Cristo Redentor e é iluminado pela ideia de decretar calamidade pública, assim sem mais nem menos, vapt-vupt. Teve preguiça de pensar em outro nome, vai calamidade pública mesmo, que é bem intenso, dramático, deve ter pensado. Imagine vocês se ele ia notar que há um protocolo internacional e que calamidade pública se decreta em casos de desastres, em geral naturais, de muito grande porte. É mais que Estado de Emergência – é desastre de nível 4, gigante.formatura

Devia ao menos ter pensado outro nome, para carioca gostar, com algum “S” ou algum “R” para musicar na fala. Mas não. Calamidade pública. Sem “s”. Sem “r”. Podia ter decretado: “sujou geral”, “parada sinistra”, “orçamento bolado”, “acabou o Caô”, “ajuda aí mermão”.

É ou não é loucura? É tipo jogar a toalha, desencanar, entregar o jogo, sair andando e dando de ombros, abrir a porta do avião e jogar o pacote, roleta russa, ligar o foderaiser no máximo. Do céu choverá os recursos que disfarçarão a má gestão de tudo o que fizeram até agora, durante um tempo até com guardanapos de linho na cabeça e sorrisos bêbados para selfies mundo afora.

Entendo que muitos de nós, eu inclusa, temos passado por dias meio assim, com nossa calamidade particular de cada dia. Vontade de fazer picadinho de boletos, fritar tarifas e impostos numa panelinha, botar uma gravação debochada para atender aos cobradores. Decretar falência, bolso furado, mandar tudo pro ar!

Mas temos nomes a zelar, uma tal reputação que precisamos respeitar, e uma cidadania a considerar.

Eles não têm nada disso.slide_268882_1863925_free

Marli Gonçalves, jornalista – Adoro o Rio por muitos motivos. Um deles é que fui feita lá.

São Paulo, metade de 2016

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