Camelôs, muambeiros e sacoleiros. Por Marli Gonçalves

Eles viraram, durante e após o período que governaram o Brasil, camelôs, muambeiros, sacoleiros. Se papai vivo estivesse, estaria assistindo aos telejornais e resmungando, tenho certeza: “esses cabras são mais sujos do que pau de galinheiro”, que ele não deixava por menos.

O assunto é fácil de entender claramente, e só não o fará quem estiver dopado, ensopado, enganado e contaminado pelas mentiras que nos últimos anos nos cansaram, nos deixando esgotados a ponto de, pelo menos eu, rezar para que esses nomes todos sejam esquecidos, mas parece mesmo impossível. Fatos vergonhosos, que nos atingem como Nação e como um povo que de um tudo faz para melhorar sua imagem no exterior, sempre estereotipada. Escândalos em cima de escândalos e esse último que nos chega ao conhecimento, com provas, imagens e detalhes, mostra o quanto esse grupo travestido de verde e amarelo pode ser tão, tão, tão…_______________ (vou deixar para o(a) querido (a) leitor(a) completar, porque agora, no calor, nada que me veio à cabeça para definir seria publicável em veículos de respeito. Teríamos de tirar as crianças da sala).

Não bastou o avião cheio de drogas. As motociatas pagas com dinheiro público, a ocupação, as fake news, o horror e ignorância. O negacionismo que nos atrasou e deixou que a pandemia matasse mais e durante mais tempo até que as vacinas chegassem. Não bastou os constantes e agressivos ataques às mulheres, aos repórteres, aos gays e minorias, as frases de mau gosto, aquele sorrisinho sarcástico com os olhos injetados. Aquelas continências e incontinências militares, o cercadinho, os cortes de verbas para as áreas sociais, o esquecimento de programas, a perseguição aos cientistas. Não bastou serem de direita, e acharem isso lindo. A boiada passando, queimando, corroendo nossas matas. As declarações de ministros e autoridades citando como suas frases nazistas. Um negro contra a luta pelo fim do racismo. As poucas mulheres do poder predominantemente masculino fazendo muxoxo das lutas femininas e feministas. Uma primeira dama de joelhos, terrivelmente evangélicos, entoando cantos incompreensíveis. O rosa e o azul definindo gêneros. Os planos de ficarem grudados no poder.  A lista é ainda maior.

Agora surgem os aspectos deles camelôs, muambeiros, sacoleiros, formando um grupo de ação “entre amigos” ampliando em benefício próprio um gigantesco e milionário butim, que pelo que vemos ainda tem apenas uma ponta do lençol levantada. Não é igual quando a gente ganha um presentinho repetido ou que não goste e que o repasse. Trata-se de joias, pedras, relógios, objetos de luxo, esculturas folheadas que atraíram a cobiça deles a ponto de levá-los embora do país na calada do fim do ano e de governo, nas sacolas que passavam livremente nos corredores do poder. Postas à venda. Até em leilões. Embolsaram, isso, foi pro bolso, em dólares. Mais um escândalo para a nossa coleção nacional, essa sim, uma coleção que não para de crescer, governo após governo.

Daqui imagino os chefes árabes que ofertaram os presentes ao saber dessas notícias nesse momento se reunindo em suas tendas para fumar um charuto e dar boas risadas entre eles, por exemplo, no caso da palmeirinha que tentaram vender achando que suas folhagens eram de ouro, e descobrindo que apenas eram folhadas, de pouco valor. Tinha um barquinho também. Ouro de tolos.  Sacudindo as joias que usam, como sinhozinhos maltas, devem rir muito do olho que esses brasileiros espicharam para os vistosos Rolex, canetas, colares, brincos que presentearam jogando como se fossem amendoins, em troca do quê ainda bem queremos saber. Ou por apenas serem esbanjadores generosos?

A polícia dirá. A história dirá. Se a Justiça punirá, e quando, e como, serão outros quinhentos. Haja ozionoterapia, agora aprovada mesmo contra todas as recomendações, e já que estávamos mesmo falando em escândalos.

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MarliMARLI GONÇALVES – Jornalista, consultora de comunicação, editora do Chumbo Gordo, autora de Feminismo no Cotidiano – Bom para mulheres. E para homens também, pela Editora Contexto. (Na Editora e na Amazon).

marligo@uol.com.br / marli@brickmann.com.br

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#ADEHOJE, #SOUMMINUTO – DIA DE REIS, DE PLEBEUS, NOSSOS DIAS

, #SOUMMINUTO – DIA DE REIS, DE PLEBEUS, NOSSOS DIAS

 

 

Hoje é Dia de Reis, de desmontar árvores, enfeites de festas, de fazer de conta que tudo vai entrar na rotina. Ouro, incenso e mirra trazidos de longe quando as relações internacionais não passavam por chanceleres e interesses pessoais de governantes gananciosos. Dia de cortar romã, pegar sementes, guardar na carteira. Uma semana intensa. É. Foi apenas uma semana e nós todos já estamos com o coração na mão, aos pulos. Repara que só passaram seis dias deste ano. E muitos sonhos já estão sendo desmontados também. Allez! Salve!

ARTIGO – Ordem e Progresso? Falta alguma coisa. Por Marli Gonçalves

bandeira BRPositivo operante. Estou numa saia meio justa e nem sei se justifica, porque ainda não tenho exatamente certeza do que acho mesmo desse lema adotado pelo governo que chamarei novo, mas só porque é novo, não por seus integrantes. Ordem e Progresso. Tem alguma coisa nele que já me incomodava ver estampado na bandeirabandeira BR

Amigo querido, conheço o publicitário Elsinho Mouco, e sua equipe, que foi quem bolou já começar o primeiro dia do governo Temer com uma nova simbologia, imagem, motivação. Achei perfeito terem pensado nisso, em um novo visual, que fosse astral. Foi ele quem encontrou a solução dentro de casa, rapidinho, nas imagens das manifestações de ruas com milhões de pessoas enroladas nelas, nas bandeiras brasileiras. Elas estavam nas ruas nas mais diversas aplicações, tamanhos, tecidos – e renderam dinheiro para os ambulantes. Se não é todo o mundo que conhece, certamente todos os brasileiros a conhecem. O verde de nossas matas, o ouro de nossas riquezas, as estrelas de nosso céu azul, e no seu meio, , o lema! Simples, compreensível, assimilável.

No novo símbolo que pretende substituir aquele horror da Pátria Educadora, que ficou só no discurso da posse da Dilma 2, a escolha caiu para o azul, em dégradé, o branco. O amarelo do ouro, aquela riqueza que a bem da verdade sumiu mesmo ultimamente, aparece só na faixa que circunda o globo que por sua vez se destaca, e parece pedir ordem e progresso em letras verdes, não tão garrafais, mas verdes. Bonito ficou. Ponto positivo. Uma coisa nacionalista. É, pode ser. Para recuperar um pouco do orgulho nacional. Sim, era preciso.

Aliás, passadas já algumas horas dos fervilhantes acontecimentos, podemos ver outros pontos positivos. Entre eles, a calmaria geral como se nada de diferente estivesse acontecendo, e como se houvesse, sim, um enorme alívio coletivo, interrompido apenas por murmúrios angustiados soluçando golpe, golpe, golpe, como se precisássemos bater nas suas costas para fazê-los desengasgarem. E o rebuliço das redes sociais, com seus militantes encastelados, de um lado e de outro formulando revoluções e resistências, ambos inúteis quando precisamos apenas de muita realidade. Até para entender o que foi isso tudo.

Horas depois da saída de um, já havia um outro governo entrando pela portinha quase que completo assumindo a direção – e até com símbolo! Isso eu achei genial. Tipo em horas trocamos tudo, bem, quase tudo – claro, cheio de resquícios esquisitos do passado recente e personagens que ainda nos deixam pasmos com suas incríveis capacidades de adaptação, troca de opinião e posição, e que colocam pedras e névoas em cima de seus passados. Se hay gobierno, yo estaré con él.

Voltando ao lema Ordem e Progresso preciso dizer que me incomoda ouvir isso e lembrar imediatamente de OSPB, Organização Política e Social Brasileira, que éramos obrigados a estudar como matéria. Literalmente, obrigados. Porque ensinava disciplinas, distribuía regras, obrigações e normas, disso e daquilo, uma coisa horrorosamente reacionária e limitadora. Pelo menos é assim que lembro, estudando no segundo grau no tempo da ditadura. Muita coisa que a gente precisava decorar. Eu odiava.

“O Amor por princípio e a Ordem por base; o Progresso por fim”. “O progresso é o desenvolvimento da ordem”. Ideais republicanos. Teoria positivista de Augusto Comte (1798-1857) foi a origem do Ordem e Progresso de nossa bandeira. Esse Comte era tão louco que chegou até a elaborar um calendário, para “desenvolver o espírito histórico e sentimento de continuidade”. Vejam só: a proposta era que o ano tivesse 13 meses de 28 dias, cada mês exatas quatro semanas, e um ano bissexto para a compensação. O dia restante no final de cada ano seria para a celebração dos mortos.

LABRASIL0219Nos anos bissextos, o outro dia que sobraria, seria para, ainda segundo a proposta dele, dedicar às Santas mulheres (?!?), ou a uma determinada mulher (?!?). Impressionante o tamanho da concessão, não? – puxa, que homem generoso com as mulheres!

Ah, vá! Mas o mais doido é que ele também propôs dar nomes aos meses, glorificando importantes da religião, literatura, filosofia, ciência e política, nessa ordem, e todos bem masculinos: Moisés, Homero, Aristóteles, Arquimedes, César, São Paulo, Carlos Magno, Dante, Gutenberg, Shakespeare, Descartes, Frederico II e Bichat, esse último nome, bem acentuado, e que foi um importante anatomista francês.

Foi saber disso para ficar ainda mais preocupada com o grupo de vetustos senhores – sem nenhuma senhora – que entrou na cabine de direção do Brasil e dessa Ordem e desse Progresso. Começo imediatamente a achar melhor propor para a gente ir cuidar das nossas vidas e de nossos costumes – do que nos é de mais precioso. Vamos dar um tempo para ver o que conseguirão fazer.

Mas enquanto isso, alertas, vamos voltar a dar atenção e cuidar de nossos avanços de comportamento, das conquistas que tivemos, lembrar das leis que derrubamos e nas que precisamos ajustar. Do que necessitamos para nossas ordens, para o nosso progresso. E, fundamentalmente, para conseguir a palavra que bem que poderia já ter vindo também estampada no novo símbolo, arejando, como lema: Liberdade. Tornaria a ordem e o progresso menos reacionários.

Senti muito a falta dela. Que isso nunca seja literal.

Marli Gonçalves, jornalista A ordem é mesmo sempre tão relativa.

São Paulo, 2016

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