ARTIGO – Quando o Carnaval passar. Por Marli Gonçalves

Se bem que Carnaval, Carnaval mesmo, pensa bem, nunca passa ou acaba por aqui, onde tudo vira o próprio, carnavalizado, e inclusive isso é o que ajuda a que nada seja enfim solucionado. Passam solenes pela “Avenida Brasil” a alegoria, as alas, as testemunhas, os atores, a gente aplaude ou vaia, e a coisa se repete em seguida, como um mantra.

carnaval
… Não cuidamos do quintal quando devíamos. E o mato crescendo; as ervas daninhas continuaram – e visivelmente continuam – a brotar…

Acontece um fato. Noticiado, esmiuçado, repercutido, agora também uma loucura nas redes sociais onde, se você é um dos que as acessa e à repercussão, sabe muito bem ao que estou me referindo e nesta semana tivemos um exemplo literalmente flagrante, com vídeos, explicações, prisões, documentos, caras pálidas e lavadas em todas as instituições. Um lado (que coisa chata essa de pensar que só existem dois lados dessa questão!) solta rojões, comemora, cria memes e charges e o “outro” reclama, ameaça, briga, baba, solta mentiras, tenta explicar até o inexplicável, defende, chama exércitos de robôs. Em um dia, segundo um instituto de pesquisa, foram 56 milhões de citações. A favor e contra, e como tudo virou a maldita divisão…Mais pra cá ou pra lá.

Parece que somos todos idiotas. Que precisam sempre ser conduzidos a um curral moral ou outro, porque não teríamos opinião própria ou capacidade de discernimento ou crítica. Cada vez mais comum e aborrecido, além de emburrecedor, inclusive na imprensa que fica, parece, tomada de muita alegria, excitação, certezas, duelo por fontes, declarações, e até adivinhações, e vai ao ar ou publicada já editorializada.

Acaba que tudo termina no mesmo rolo, até que apareça outro. Aconteceu durante anos com a Lava Jato, e estamos vendo no que deu. Ou melhor, no que já até já está virando novos enredos para os carnavais seguintes, e com tramas fantásticas e difíceis de desvendar. Se não acompanhou o caso, acredite, tudo já vinha mesmo repleto de falhas graves, aberturas para questionamentos futuros, improvisos, furos impressionantes. Um molde que continua sendo usado. Daí tudo virar apenas Carnaval o ano inteiro. Aguarde só os próximos lances seguindo a Quarta-Feira de Cinzas. Será que agora vai?

 Acontece todos os dias com o noticiário sobre violência, onde nem mais conseguimos contar o número de vítimas entre inocentes, culpados ou “suspeitos”, cada vez mais termo usado – os tais supostos suspeitos, mesmo que filmados, condenados, e sempre como se imparcial isso fosse – muitas vezes duvidando até da mais cruel realidade.

Dizem que no Brasil tudo é futebol. Acrescento, assim, que também tudo é Carnaval. Cheios de máscaras, fantasias, foliões, paixões efêmeras e um certo embebedamento, letargia. Nos últimos anos vivemos envolvidos nesse baile, perigoso baile. Com possibilidade, perigo, como agora ainda melhor informados, inclusive, de fechamento de tempo, de retorno ao que já tivemos de mais cruel.

Sabíamos disso? Sim. Porque então deixamos que isso transcorresse como normal? 8 de janeiro não foi o único ápice. Tivemos um dia a dia pavoroso antes, durante quatro anos, no meio da mortal pandemia. Há tempos vemos a bandeira nacional ser usada como logotipo até de uma tentativa de guinada para o nevoeiro, para uma nebulosa e esburacada estrada. Ficamos esperando que apenas alguém, algum herói – e eles, acredite, não existem – parasse esse curso, vergando ou o manto negro da toga da Justiça, ou até mesmo a faixa presidencial.

Não cuidamos do quintal quando devíamos. E o mato crescendo; as ervas daninhas continuaram – e visivelmente continuam – a brotar, tornando cada vez mais difícil arrancá-las para a primavera, e porque ainda muitos as confundem com as flores da liberdade.

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marli -fev24MARLI GONÇALVES – Jornalista, consultora de comunicação, editora do Chumbo Gordo, autora de Feminismo no Cotidiano – Bom para mulheres. E para homens também, pela Editora Contexto. (Na Editora e na Amazon). Vive em São Paulo, Capital.

marligo@uol.com.br / marli@brickmann.com.br

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ARTIGO- Todos somos olhos, caras e bocas. Por Marli Gonçalves

Todos somos olhos, todos somos repórteres? É perceptível a guinada que vem ocorrendo especialmente nos noticiários de tevê que observam, dão espaço e fazem render a ânsia que agora as pessoas têm de se mostrar, participar, dar pitacos.

todos somos olhos e bocas

Antes, no tempo do onça, para se comunicar com algum veículo de imprensa era preciso mandar uma carta para a Seção do Leitor, ou mesmo tentar ir à redação fazer seus apelos pessoalmente. Tempos bem idos lá longe porque hoje as redações estão como se hermeticamente fechadas, quando antes eram mais vivas, acessíveis. Até contato telefônico por números fixos basicamente impraticável. Com o advento do e-mail ficou mais simples um pouco. Mas principalmente na tevê, novas mudanças: primeiro disponibilizaram um número de WhatsApp, e agora pelo menos a Globo inovou: o telespectador é encorajado a acionar um QR Code, fazer um cadastro e voilà. Pode mandar mensagens, vídeos, fotos e etceteras dos fatos que acompanhou ou quer denunciar. As pessoas comuns estão na tevê, via câmeras de celular, e por mais simples que sejam aparecem de seus cantos, casas e barracos mostrando a realidade que vivenciam.

Assistimos assim, literalmente, a vida ao vivo. Assaltos, sequestros, cenas de violência filmadas de janelas. O desespero das falhas no transporte público e a falta de apoio, tudo registrado, e negando no ar, na hora, as tais providências alardeadas pelas autoridades. Os carros boiando em enchentes e o momento até da queda de aeronaves. Milhares de Grandes Olhos vigiando tudo, além das câmeras das ruas e das casas. Fico imaginando como é feita – e se é feita, dada a rapidez da informação, a checagem de milhares de mensagens que devem chegar diariamente.

Tenho refletido muito sobre a imprensa, como jornalista há mais de 45 anos e vinda de uma escola, o extinto Jornal da Tarde, que prezava acima de tudo os fatos ocorridos na cidade, São Paulo no caso, e a busca de uma visão sempre mais humana em bons textos e imagens. Assim, consigo ver muitos aspectos positivos nessas mudanças, e reparado como vem sendo grande também a busca por levar ao ar muito mais prestação de serviços – agendas de lazer, explicação de preços e fatos políticos, sociais e econômicos de forma mais simplificada – além do registro das condições e realidade (repara: há repórteres que parecem estar se especializando nisso, pé na lama, só não sei se de bom grado ou se sempre obrigados por chefias).

Em artigo anterior, Influenciadores e Influenciados, foquei no absurdo aumento de todos os tipos de influencers, e acabou surgindo uma discussão sobre se seria isso jornalismo. Um debate. Insisto que não. Jornalismo é coisa séria, requer regras e ética, técnicas, experiência, embora pareça que andam esquecendo de ensinar muito disso nas poucas universidades que ainda restam. Mas não posso deixar de notar que, por outro lado, cada vez mais os “influencers” têm criado notícias e estas invadem os portais e jornais. Sem compromisso, têm cara de pau  que jornalistas não têm para fazer coisas e muitas vezes formular perguntas, e  que nem poderiam, até por muitas beirarem insanidade, desrespeito ou alguma curiosidade exótica. Os influenciadores, produtores de conteúdo como se denominam, têm. E conseguem respostas que acabam virando notícias reconhecidas. Confidências sexuais, fofocas, desavenças, os tais flagras que chegam até a ser engraçados porque muitas vezes quase teatrais, armados, ensaiados, pensados.

A imprensa séria, oficial, no geral, está em crise, e buscando de todas as formas sobreviver e se reinventar, mas seu campo é limitado. Seus espaços, os profissionais limitados, o papel, e até o lugar onde habitualmente é vendida, as bancas, virando verdadeiras lojas de badulaques e onde agora ocupam cantinhos. Apostam tudo nas edições digitais, assinaturas, ofertas. Na tevê, agora, também em simpatia, proximidade e descontração.

Para completar, ultimamente têm precisado esconder sua cara de tacho depois que as intensas coberturas cheias de certeza de anos a fio estão sendo arruinadas. A Lava Jato, o juiz justiceiro, os acordos de leniência, as delações premiadas, as prisões, as gravações, muito do que se noticiou – tudo indo por água abaixo. E ainda precisando duelar diariamente com as fake news cada vez mais perigosas, mesmo que tolas, e que se espalham mais do que qualquer notícia séria. Pior, com gente achando graça.

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marliMARLI GONÇALVES – Jornalista, consultora de comunicação, editora do Chumbo Gordo, autora de Feminismo no Cotidiano – Bom para mulheres. E para homens também, pela Editora Contexto. (Na Editora e na Amazon). Vive em São Paulo, Capital.

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ARTIGO – Perguntas que faço. Por Marli Gonçalves

Como você está? Nesses mais de cem dias, que parecem séculos, de quarentena e isolamento social, tanta coisa mudou, tantas coisas ficaram para trás, por imediatamente consideradas desimportantes ou por terem se tornado impossíveis até de se pensar sobre elas. Muitos sentimentos se misturam, e isso é muito pessoal, individual, chega a ser solitário

PERGUNTAS

Como você está? Tem ficado meio paranoico com limpeza? E os sonhos/ pesadelos estão bem loucos? Ouviu falar que isso está acontecendo com todo mundo? Tem conseguido tomar decisões? Pensar no futuro? Acha que o mundo vai mesmo mudar – para melhor ou pior – depois de tudo isso? Tem tido oscilações de humor, otimismo, que parecem montanha russa, e é obrigado a disfarçar, o que piora ainda tudo mais? Está tudo meio descontrolado? Horários, trabalho, disposição, pensamentos, desejos, inclusive sexuais? Do que sente falta?

Tem encontrado prazer em fazer coisas corriqueiras como cozinhar, jardinagem, séries de tevê, filmes B, comédias românticas que arrancam lágrimas, novelas velhas sendo repetidas? O meu cúmulo, confesso, se deu quando me peguei essa semana arrumando as roupas para secar no varal como se fosse arte para uma foto, tudo esticadinho, cor com cor, calcinhas de um lado, meias de outro, tudo equilibrado.

Enfim, o melhor e mais seguro lugar do mundo passou a ser sua casa e cada vez que tem de sair sofre? Incorporou a máscara? Fica muito exasperado quando encontra alguém ou sem ela, ou com ela no queixo, no braço, no pescoço, pendurada na orelha ou pendurada no retrovisor do carro? E as jogadas nas ruas? Fica perplexo e desiludido com a humanidade ao saber das aglomerações, festas, verdadeiros desafios e focos de contaminação?

Como você está? – pergunto novamente. Dizem que fazer testagem mais completa seria bom, mas já viram os preços? E as dificuldades impostas para consegui-los em postos de saúde ou com os convênios médicos? Os testes rápidos viraram febre, mas têm questionados sua eficácia real, a história do falso positivo, falso negativo.

Pelo que estou vendo, somos normais. Está acontecendo e é geral essa que pode ser chamada angústia, mas é até mais do que isso.

Lidamos com medos o tempo inteiro em nossas vidas, mas parece que desta vez esse sentimento mundial, a possibilidade de morte tão próxima de nós e de quem amamos, ou mesmo de quem apenas sabemos, uma morte besta, por um vírus microscópico, invisível, aéreo, feio e cheio de pontas, nos tornou mesmo outras pessoas. Para o bem e para o mal, que tem gente para caramba se dando bem, e aproveitando para abrir o saquinho de maldades, roubar, deixar passar a boiada em algum assunto.

Como você está? – insisto. 70 mil mortes no país, número oficial, e que pode ser ainda muito maior. Difícil não ter sido atingido de alguma forma, no mínimo por um terrível sentimento de impotência. Ou, pior, pela perda de alguém querido, um familiar, um alguém que lhe era importante. Essa semana perdi um grande e admirado amigo, mestre de décadas: o escritor, teatrólogo e pessoa boa Antonio Bivar. Ficaria horas falando sobre ele. E bem. Um garoto de 81 anos que flanava pela vida da forma mais simples que pode haver, caminhando nas ruas, sentindo o ar, ouvindo as pessoas, se enternecendo por suas histórias, acompanhando-as em suas pequenas vitórias.

 Me senti dividida entre sentimentos difíceis de serem descritos, além da tristeza. O alívio de quem não queria que ele sofresse mais numa cama da UTI. Raiva, muita, por esse vírus levar embora ele e tanta gente boa com ainda tanto a fazer, produzir, acrescentar.  Dúvidas, ouvindo números assustadores e a reabertura das porteiras, lojas, atividades, de uma forma um bocado confusa. Pavor, por encontrar nas ruas muitos que parecem ainda não se dar conta do quanto pode ser terrível essa doença e que ninguém, ninguém mesmo,  sabe se está entre estes que sucumbirão, ou ficarão com sequelas, ou se terão apenas sintomas leves, ou mesmo nem isso – apenas poderão transmitir; deixá-lo, traiçoeiro, onde tocarem, por exemplo.

Fora, enfim, estarmos governados por um presidente, agora infectado, como até parece ter sido, mas que ninguém põe a mão no fogo por conta de tantas mentiras já contadas, e que ainda insiste em propagandear um perigoso medicamento que mandou produzir aos milhões.

Eu teria muitas perguntas ainda a fazer sobre como estamos nos sentindo em vários aspectos, e certa de que estaria ouvindo você responder: “eu também”. Mas não temos outro jeito por enquanto a não ser enfrentar nossos medos, nossas tristezas e, especialmente, essa máquina louca de pensamentos só nossos e que às vezes nos pega tão sozinhos os combatendo, os afastando, mas eles teimam em voltar, voltar…

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MARLI GONÇALVES – Jornalista, consultora de comunicação, editora do Chumbo Gordo, autora de Feminismo no Cotidiano – Bom para mulheres. E para homens também, pela Editora Contexto. À venda nas livrarias e online, pela Editora e pela Amazon.

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ARTIGO – Pesadelos no país tropical. Por Marli Gonçalves

O Sol escancarado, o céu azul, a temperatura amena, as noites fresquinhas, quase tudo o que a gente poderia precisar para ser feliz. Mas quem consegue? Com sobressaltos de dia, de tarde, de noite… e de madrugada! Os sonhos são estranhos, os pesadelos reais. Os dias, o tempo, o futuro, alterados.

Mauvais rêve | Mon petit nombril

Nas ruas, um bando de gente louca continua andando pra lá e pra cá sem máscara, ou com ela, digamos, posta ou pendurada em lugares bem estranhos. Precisa dizer que não precisa tirar para falar ao celular? Que máscara é feita para cobrir o nariz e a boca, os principais meios de transmissão dessa doença maldita que veio bagunçar o coreto mundial coma música tenebrosa do terror? Que o horror é invisível?

O inverno deve ser longo: arrebatou o verão, o outono e já se anuncia na primavera do ano que não mais esqueceremos. Ultrapassamos oficialmente um milhão de infectados, quase 50 mil mortos. Por essas e outras que parece que a cada dia, as coisas pioram, e não é só no número, mas com o bagunçado afrouxamento das regras da quarentena, com a forma que as informações (não) são entendidas e em um momento tão delicado.

Pegam o mapa e colorem: vermelho, laranja, amarelo. Regras são baixadas alegremente como se nosso povo fosse suficientemente esclarecido para segui-las sem a devida fiscalização, que todos sabem que não haverá, ou se ocorrerem, só pescam as sardinhas tentando fugir de tubarões. Um dia se fala uma coisa; no outro, já não é mais. Fora as medidas que só podem nos fazer gargalhar, tipo aquela de que os ônibus só poderiam circular com as pessoas sentadas – e que não levou em conta, por exemplo, que ninguém anda querendo sentar nem ao lado, nem no quentinho de outras pessoas. Tem quem prefira só pegar nos ferros; depois limpar as mãos. Por aqui em São Paulo, já caiu essa medida também. Não, ninguém mandou aumentar a frota, para evitar aglomeração e gente pendurada; e os horários escalonados estão bem doidos. As portas se abriram, e as pessoas precisaram sair, com sua fome, seus medos, suas obrigações.

Outro dia, onde entrei, encontrei uma figura, uma mulher – que deixo pra vocês bem imaginarem suas divertidas formas e triste tipinho –  toda metida, sentada no meio de mais gente, sem máscara, e que ousou ficar toda irritada e emproada porque perguntei na hora a ela se era possível que pusesse, então, um farol verde sobre sua “linda” cabeça, já que, ríspida, disse que já tinha contraído o vírus e não precisava mais usar. Ela fechou a cara. Portanto…Volto a perguntar: e vocês acham mesmo que sairemos melhores dessa? Infelizmente o que tenho visto está na linha do “cada um por si”, e já nem falo em Deus, porque nem Ele deve estar acreditando o quanto seu Santo Nome vem sendo clamado em vão.

Meu lado diabinha tem pensado seriamente em começar a espirrar e tossir bem perto desses seres, só de sacanagem. Mas na verdade me sinto – e vejo muita gente que conheço da mesma forma – cada vez mais preocupada e isolada, até para evitar aborrecimentos, já que não tenho um pingo de sangue de barata em minhas veias.

O mesmo sangue que simplesmente ferve ao acompanhar a escalada vertiginosa da crise política. Que chega ao cúmulo do cúmulo, acumulando as digitais de um presidente cada vez mais insano e sua família e equipes envolvidos em tudo de ruim, perdidos, tentando justificar malfeitos diários, muitos até mais antigos, revelados pela imprensa que odeiam com todas as forças.

Dizer que o país está à deriva é pouco: todo o futuro está comprometido. Olha as áreas de Educação e Saúde, os desatinos da área econômica, o relacionamento diplomático, agora também estamos mandando lixo para instituições mundiais, como é o caso do ex-ministro Abraham Weintraub. Os poderes se digladiam entre si, as forças militares se assanham ocupando alguns postos chave. Saqueadores de outrora se aproximam, sedentos e cobrando caro para serem muletas e esteios de poder.

Enfim, um pesadelo, como os que vêm ocorrendo em nossas noites de sono e insônia, desses, que estamos caindo em um abismo, sendo perseguidos, gritando por socorro sem seremos atendidos, pendurados numa corda puxada de um lado e de outro.

O problema é que a tal corda puxada e que se estica está mesmo enrolada em nossos pescoços. O que descobrimos todos os dias, bem acordados. Apavorados.

– “Pamonhas, pamonhas, pamonhas” – um carro com alto-falantes passa agora aqui em frente, percorrendo as ruas. Essa realidade é mesmo muito dura em seus sinais.

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MARLI GONÇALVES – Jornalista, consultora de comunicação, editora do Chumbo Gordo, autora de Feminismo no Cotidiano – Bom para mulheres. E para homens também, pela Editora Contexto. À venda nas livrarias e online, pela Editora e pela Amazon.

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ARTIGO – Estamos todos ajoelhados? Por Marli Gonçalves

Ou estamos todos sufocados? No mundo inteiro, em fotos simbólicas, nas grandes manifestações contra o racismo, contra a morte, nos Estados Unidos, do negro George Floyd, sufocado pelo joelho de um policial branco por exatos oito minutos e quarenta e seis segundos, as pessoas vêm se ajoelhando.

E os joelhos que também podem matar adquiriram assim mais um sentido, o que não é de submissão a nenhuma autoridade, nem de humilhação. Ao contrário, são momentos de súplica para um basta. Resistência. Um basta ao desprezo pela vida humana, tão claramente exposto essa semana também pela morte, em Pernambuco, do menino Miguel, cinco anos, deixado em um elevador que o elevou, sim, mas ao nono andar de um prédio luxuoso de classe alta onde uma grade se desprendeu em sua procura pela mãe, e o projetou 34 metros abaixo.

Negro, criança, pequenino, havia sido deixado por minutos pela mãe sob os cuidados da loura patroa mulher de prefeito que a havia mandado passear com o cachorro da casa. Bastava que ela, a patroa, o tirasse do elevador para onde correu – mas ela, não, fez pior, apertou ainda o botão para que o elevador subisse. A mãe de Miguel, hoje com razão desesperada, pergunta: e se fosse ao contrário? Os joelhos da sociedade estariam sobre seu pescoço. Enquanto a patroa rica pagou uma fiança e está em liberdade.

João Pedro, 14 anos, negro, brincava dentro de uma casa em São Gonçalo, no Rio de Janeiro, quando um tiro o atingiu pelas costas, vindo de mais uma desastrada operação policial, dessas que atira para todos os lados, especialmente em comunidades negras, pobres, e que tantas crianças matam, tantas pessoas matam.

Nós nos ajoelhamos para rezar por elas, sempre mais tarde de tudo que poderíamos ter feito.

Vidas negras importam, diz o movimento que se espalha pelo mundo. Vidas importam, todas, ainda não diz claramente o movimento que esperamos de joelhos aqui no Brasil. 35 mil mortos em poucos mais de cem dias da pandemia de Covid-19, negros muitas de suas principais vítimas. Um presidente que diz “E daí?”, que balbucia sem corar que “sente muito, mas todos vamos morrer”, como se essa frase fosse de alguma inteligência e não apenas demonstrasse o profundo desprezo pela população que governa e que é encaminhada para um matadouro, às vezes até com pauladas mesmo.

Como representante dessas vidas negras, é posto um ser asqueroso, que chama o movimento antirracista de “escória” e continua ali como se nada tivesse acontecido, sentado em sua cadeira na Fundação Palmares, talvez se achando de branca candura, sem se ver negro, sem se ver, sem fazer.

Eu quase já não consigo mais respirar esse ar nacional há mais de um ano e meio, desde que esse grupo chegou ao poder buscando asfixiar tudo o que é livre, sensato, conquistado. Que vem dando largos passos em direção a um abismo irracional e de ignorância aproveitando as mortes que incentiva em seus movimentos contra o isolamento social, aproveitando nossa perplexidade com atos e fatos que se sucedem dia a dia mais graves e cruéis.

Está tudo em vermelho e negro. A informação acaba sendo o vermelho sangue que corre nas veias do país que parece não mais querer acreditar nelas, as notícias, os fatos sendo revelados, como se estancar esse sangue com cegueira pudesse paralisar todo esse mal que nossos joelhos sangram de tanto que os dobramos para orar, com fé , em súplicas, pelo entendimento da importância de uma democracia, por Justiça e igualdade entre todos, raças, gêneros, classes, povos.

Ele implorava. Não consigo respirar. Não consigo respirar. Não consigo respirar. Por, repito, oito minutos e quarenta em seis segundos, ele implorou. Os joelhos que asfixiaram George Floyd, cena assistida, gravada, documentada, é muito mais do que apenas americana, muito mais do que apenas contra a violência policial ou o racismo. Ela é a forma sufocante da morte de quase meio milhão de pessoas em todo o mundo nesse terrível 2020.

Estamos todos já quase sem ar, e preocupados com o avanço do sufocamento democrático desse desleal grupo no poder. E o que parece é que esse poder já está tomado. Pelo fatos, posições, pelo silêncio nacional de um povo que se humilha, sendo que um percentual deles, infelizmente, se ajoelha paramentado em verde e amarelo por adoração a (mais um) ídolo de barro, onde ele apenas escorrega, sem cair de vez.

 

 

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MARLI GONÇALVES – Jornalista, consultora de comunicação, editora do Chumbo Gordo, autora de Feminismo no Cotidiano – Bom para mulheres. E para homens também, pela Editora Contexto. À venda nas livrarias e online, pela Editora e pela Amazon.

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ARTIGO – Alvoroço no Alvorada. Por Marli Gonçalves

Virou praxe. No nascer do dia, logo após o toque de cornetas, clarins e tambores nos quartéis ao amanhecer, na alvorada, surge um homem completamente alterado à porta de seu Palácio, o Alvorada. Ele vai abrir a boca, dizer sandices, um ou dois ou mais palavrões, gesticular, ameaçar a democracia e as instituições, pior, por isso ser aplaudido por um pequeno grupo fazendo alarido no seu quintal

Agora esse homem deu até de usar gravata ostentando o símbolo de suas loucuras. Pequenos fuzis em verde e amarelo, como tão bem registrou o genial repórter fotográfico de Brasília e da história, Orlando Brito. Outro dia mesmo, Brito, mais de setenta anos, foi ao chão, teve os óculos quebrados por essa turba que surrupia as cores e símbolos nacionais para enaltecer o obscuro, para tentar que o Brasil novamente anoiteça sem liberdade. Outro repórter, Dida Sampaio, derrubado e chutado.

Não era sem tempo que alguns dos principais meios de comunicação do país deixassem de presenciar essa cena macabra ocorrendo sob o brilhante céu da Capital da República, onde diariamente – além de registrarem esses descalabros – ao tentarem fazer perguntas, recebem de volta ironias, provocações e ameaças que vêm aumentando em escalada, sem que providências sejam tomadas para garantir minimamente sua presença no local. Essa semana muitos deram um basta.

Mas o homem não para. A cada dia mais violento, ameaçador, faz desse show matinal material para os vídeos que planta na internet para serem dispersados por uma equipe que coordena milhares de robôs e gente que se diz “patriota”, entre outros que, coitados, acreditam que os robôs sejam gente de verdade. Nessa semana vimos bem a cara de alguns desses seres digitais capturados na realidade da rede de uma parcela da Polícia Federal que se esmera pela independência.  O homem chiou, os olhos chisparam, mais disparates foram ditos, feitos, anunciados e ordenados em ameaças, inclusive de grave descumprimento da ordem constitucional.

A cada alvorecer mais preocupante, os dias nacionais quando já acordamos em sobressaltos, como se já não bastassem os milhares de mortos, os números que diariamente sabemos no crepúsculo dos dias em meio à pandemia, ao desencontro de ações, dos conflitos entre regiões, do vazio verde-oliva ocupado na Saúde por patentes e coturnos.

A vestimenta da Alvorada traz detalhes que acabam passando, como se lei não tivéssemos mais: talvez vocês não tenham reparado ainda que o homem da gravata com fuzis agora aparece cercado por seus seguranças ostentando máscaras de proteção com a sua figura carimbada, em um personalismo que conhecemos no século passado durante a ascensão do mal do fascismo e nazismo.  O “e daí?” usado alegremente na máscara da deputada que já estaria cassada em momentos normais. E naquela reunião do dia 22 de abril que agora, perplexos, assistimos, vários ministros e autoridades regurgitaram suas ignorâncias em alto e bom som, sem que tenham sido presos. Aliás, o que é compreensível, se ali tivesse havido voz de prisão entre uns e outros não sobraria quem apagasse a luz daquele salão.

O alvoroço não é pouco, e se distribui muito além da alvorada e do Alvorada, das manhãs, tardes e noites, causando inquietação no nosso sono das madrugadas, do Planalto às planícies; entre os Poderes, agora em isolamento social, engaiolados em lives e encontros digitais, reuniões extemporâneas, declarações e notas de repúdio em redes e folhas de papel que não duram minutos respirando até que outras tenham de substituí-las.

Fosse só o homem, mas ele tem os filhos enumerados, porque agora é moda, além do banheiro, o ir lá fazer 01, 02, que já era bem ridículo como expressão. Temos por aqui mais zeros, sempre à esquerda, nunca nos lugares onde no mínimo deveriam estar trabalhando, mas tentando desgovernar juntos, como clones do sobrenome que precisamos urgentemente, e antes que seja tarde, parar.

Nosso alvoroço – dos que prezam pelas liberdades individuais e pelo respeito – tem de começar a ser sentido lá no Alvorada.

Nossa alvorada haverá de ser muito melhor. Do jeito que está, sujeita a trovoadas, poderá nos levar a uma noite terrível. Mais terrível dos que os pesadelos que atormentam nosso sono buscando sobreviver, além da pandemia, além deles, e de todo o atraso e violência que claramente representam.

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MARLI GONÇALVES – Jornalista, consultora de comunicação, editora do Chumbo Gordo, autora de Feminismo no Cotidiano – Bom para mulheres. E para homens também, pela Editora Contexto. À venda nas livrarias e online, pela Editora e pela Amazon.

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FONTE: OS DIVERGENTES – FOTO DE ORLANDO BRITO

ARTIGO – O epicentro de cada um de nós. Por Marli Gonçalves

Acostumada a vida inteira a resistir às inúmeras pressões, dificuldades, verdadeiras visões do inferno assistidas como jornalista, como mulher, na vida pessoal, admito: me encontro agora com o emocional abalado como há muito não acontecia. Pior: desta vez não está em minhas mãos a solução, mas na de todo um país, completamente desarvorado, triste, confuso, louco, e claramente nas mãos de uma equipe de desajustados. Mais perigosos a cada dia que passa.

Saxofonista. Pano de fundo preto. — Vetores de Stock © JonCrucian ...

Sim, é um desabafo. Sincero, necessário, para não explodir. Sinto também que falo por muitos e muitas em todos os cantos desse país perplexo e assustado, que tem medo não só da mais da morte ou da terrível doença que nos assola a todos, mas também do desenrolar do embaraçado (e embaraçoso) novelo político que torna tudo ainda pior. Não há nervos que aguentem.

Rompi em choro descontrolado pouco antes de começar a escrever. Assim. Ouvia o noticiário de tevê, com todo o cotidiano das histórias terríveis, emocionantes, dos números tenebrosos, dados sobre a ignorância das desobedientes aglomerações, as falas patéticas reveladas, a queda de mais um Ministro da Saúde em meio a esse caos, quando de repente ouvi um som magistral, um jazz. Não vinha da tevê, claro, que dali ultimamente as belezas andam afastadas.

Corri à janela e, lá embaixo, estava, na esquina, um solitário saxofonista que entoava as mais belas canções, Pixinguinha, Adoniran, Tom Jobim, Cole Porter. Junto comigo, outras janelas se abriram juntando seus sons a aquele som mavioso, esse despertar. As minhas lágrimas teimosas rolaram com gosto, como um desabafo necessário, que devia estar ali represado, querendo virar água, fluir.

Somos todos hoje nós mesmos um epicentro – essa palavra que tanto ouvimos – e que veio se mudando, da China, passando pela Europa, Estados Unidos, até nos atingir tão pesada e brutalmente. Somos, cada um de nós, um epicentro de emoções. Tão controversas quanto absolutamente incontroláveis.

É bonito demais ouvir as janelas se abrindo. As pessoas aplaudindo, várias mandando colaborações para aquele chapéu que o músico passava, para amealhar alguns trocados.  Creio que todos um dia merecem ouvir serenatas. Por aqui onde moro, São Paulo, sempre estranhei não ver ninguém nas janelas, as cortinas sempre fechadas. Precisou desse isolamento para descobrirem que elas podiam ser abertas. Para ouvir seja a música do saxofonista, do amolador de facas, ou o som do bater das panelas, dos protestos que se multiplicam, entoados pelos mais ativos. Muito além dos costumeiros alarmes disparados, das ambulâncias e sirenes, do trovoar, das turbinas do aviões que já não cruzam mais os céus.

SAX MUDOSair às ruas não dá mais prazer como outrora. Não há passeio ou destino legal quando se sai apenas por necessidade, para o médico buscando socorro, para o mercado onde os preços nos esmagam a cada dia mais, assim como na farmácia onde borrifam um álcool gel fedido em nossas mãos, como se fizessem algum favor. Não reconhecemos rostos amigos que passam de nosso lado, e os olhos, ah, os olhos descobertos! Nos rostos mascarados demonstram toda essa ansiedade, o pavor, e a tristeza. Claro, isso quando a máscara não está no queixo ou, às vezes, nos mais humildes, tão suja que dificilmente pode proteger alguém, seja de fora ou de dentro.

As insanidades, as frases irritantes, as revelações em gravações, vídeos, as ordens e medidas sem pé nem cabeça tomadas por governantes que se debatem uns com os outros, ver um povo tão dependente de um líder que é capaz de ficar cego, pular num cadafalso, num buraco aberto. E incitados por alguém que a cada dia parece apenas querer provocar a hecatombe, e que ele, sim, no momento é o epicentro de tudo que é ruim, e que nos traz ainda mais angústia. O epicentro do mal.

Como assim? Exames de laboratório feitos com pseudônimo inventado? Airton Guedes, Rafael Augusto Alves da Costa Ferraz, 05? Vocês já tentaram fazer algum exame, sem que tenham pedido inclusive documentos originais, com foto, carteirinhas e etcs? Como alguém pode achar isso normal, aceitar? Dois ministros da Saúde derrubados no meio de uma pandemia sem igual, em menos de um mês? A insistência em um remédio rejeitado pela comunidade médica internacional; o que ele pretende? Até onde vamos deixá-lo chegar? Até onde essa equipe desnorteada e má continuará agindo, enquanto estamos amarrados, isolados?

Precisamos abrir mais nossas janelas para conversarmos pessoalmente entre nós, e nem que seja aos gritos.

Nem sempre tem um saxofonista na esquina. Mas não seja por isso: sempre haverá um Hino pela Liberdade a ser entoado.

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MARLI GONÇALVES – Jornalista, consultora de comunicação, editora do Chumbo Gordo, autora de Feminismo no Cotidiano – Bom para mulheres. E para homens também, pela Editora Contexto. À venda nas livrarias e online, pela Editora e pela Amazon.

marligo@uol.com.br / marli@brickmann.com.br

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ARTIGO – Calar? Jamais. Por Marli Gonçalves

Todo dia, toda hora, todas as manhãs, tardes e noites de um momento tão doloroso como esse que vivemos,  ansiosos, preocupados com nossas famílias, amigos, com quem amamos, como sobreviveremos, temos de ainda ouvir a voz estridente e ver os atos de um presidente sem noção e deslocado da realidade nessa acelerada marcha de insensatez. Que ainda ousa gritar para a imprensa calar a boca…

– “Cala a boca, que eu não te perguntei nada”?

Como ousa? Quem pergunta, aqui, somos nós, presidente. E são muitas essas perguntas. Não queremos calar sua boca, mas interromper o quanto antes e enquanto ainda é tempo – e esse se esvai – a sua visível loucura, destempero, incapacidade de liderança. Suas marchas insanas. Suas aparições assombrosas. O terror das milícias que o apoiam, incentivando grupos, violência, agressões e ataques, as carreatas da morte e agora, nessa última versão, suas passeatas com engravatados contra a democracia, invadindo os guardiões da ordem constitucional. Não nos calaremos, mas o senhor poderá, sim, ser afastado.

Ter o poder não lhe fez nada bem, e parece piorar a cada dia, nessa ânsia de querer ter razão, querer se desvencilhar de culpas que já estão em seu colo, explodindo como bombas do Riocentro, daquele período de terror que tanto admira.

Olhe no espelho, senhor presidente. Pegue uma foto antiga sua, nem precisa ser de muito tempo atrás, pode ser de quando era apenas mais um deputado mequetrefe do baixo clero, que de vez em quando aparecia como boquirroto. Até que dava pro gasto. Hoje o senhor está acabado, envelhecido, transtornado, impaciente, seus olhos apenas transmitem ódio e ironia, transmitidos geneticamente inclusive aos seus filhos, os numerados. O ciúme de quem se destaca, indisfarçável. Sua face, rígida, pálida como a morte, não haverá máscara que a cubra.

bocafalanteO senhor não está nada bem. Já não consegue nem mesmo disfarçar. O medo, a raiva, a sua própria ignorância, despreparo para o cargo, para a indicação de sua equipe – já está tudo desfraldado na sua imagem. Nas imagens que produz. No asco que causa na maioria de nós. Nas piadas que já contamos sobre vocês todos, publicamente.

De nós, já está afastado. Somos gente comum, trabalhadores, brasileiros, parte de uma população apavorada com um vírus que se espalha pelo ar, de pessoa a pessoa, causando uma doença de difícil cura, com graves sequelas, e que mata sem dó pessoas de todas as idades, lotando hospitais, já obrigando a que profissionais de saúde escolham quem poderá ser socorrido, macabra loteria.

Qual é a sua? Diga logo a verdade, o que é que ousa pretender? Por que não para de nos prejudicar? De nos envergonhar diante do mundo? O país pagará esse preço por muito tempo, dias que já estão marcados na História.

Por que não dá ênfase à busca de mais testes em massa? À compra de respiradores e equipamentos e contratação de equipes que já faltam em todo o país?  Onde estão as medidas reais para salvar a economia, de que tanto fala? Porque não sabe o que fazer, admita.

O senhor entende que jamais dormirá em paz novamente porque o peso de muitas dessas mortes já recai sobre as suas costas e essa sua insistência em negar a importância do isolamento social, da quarentena, e que tem levado à desobediência da que ainda é a única medida possível hoje para ao menos conter o avanço da contaminação?

Não é capaz nem de ao menos perceber que a cada dia as medidas precisarão ficar ainda mais rigorosas, ao invés de serem relaxadas, e por sua causa? Os governadores e prefeitos um pouco mais sensatos obrigados a diariamente atropelar seus desfeitos e desmandos.

Por que o senhor, essa equipe e gente desconectada da realidade que o segue como zumbis, não veem o que acontece à cada medida improvisada, a cada crise institucional?

Repito: o senhor não está nada bem. E tudo que faz está sendo escrito, filmado, registrado, bastante comentado.

Eu não me calo. E sei que não nos calará. Nem adianta tentar, porque a cada dia somos mais e mais, contando agora com muitos dos que um dia até o apoiaram, e se sentem traídos. E que estão muito bravos, senhor. E desilusão não tem volta.

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MARLI GONÇALVES – Jornalista, consultora de comunicação, editora do Chumbo Gordo, autora de Feminismo no Cotidiano – Bom para mulheres. E para homens também, pela Editora Contexto. À venda nas livrarias e online, pela Editora e pela Amazon.

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#ADEHOJE – SÓ PERGUNTAS: JÁ FORAM PRESOS? OS LUGARES, INTERDITADOS?

#ADEHOJE – SÓ PERGUNTAS: JÁ FORAM PRESOS? OS LUGARES, INTERDITADOS?

 

SÓ UM MINUTO – Hoje só tenho perguntas para fazer. O Flamengo já foi punido? Os lugares já foram interditados? O presidente do Clube e os diretores já foram presos? Ah, o presidente da Vale e os diretores já foram presos. Aliás, o presidente da Vale já pediu demissão? Até quando vamos ficar quietos diante da impunidade? Quem é que vai sair correndo para torcer pelo Flamengo? Só hoje é que se tocaram que o time estava treinando no Ninho do Urubu assassino??? Eles sabiam o que estavam fazendo. São responsáveis. Ou melhor, irresponsáveis.

O que perguntar?

 

#ADEHOJE, SÓ UM MINUTO – PERGUNTAS ARMADAS

#ADEHOJE, SÓ UM MINUTO – PERGUNTAS ARMADAS

 

Só um minuto; MAS HOJE SERÃO DOIS – Mas se passar procura o vídeo completo no YouTube. Já vou começar dizendo; eu gosto de armas, sempre convivi com elas, mas sou pacifista e não acho que devamos armar a população O primeiro decreto! Tantas coisas precisando de arrumação no país e o presidente Jair Bolsonaro decreta a liberação da posse de quatro armas! Quatro, 1,2,3,4! Se não fiscalizam nem buracos de rua, como vão fiscalizar os requisitos?

– O exame psicológico! 10 anos! O cara faz o exame, passa e pira no dia seguinte;

– Escola! Curso de tiro! Já imaginaram o número de escolas de araque que surgirão? Se não se fiscalizam nem as autoescolas!

– Quatro! 1,2,3,4. As casas virarão fortalezas armadas. Só uma pessoa poderá manusear?

– Ah, e a declaração necessária de que tem um lugar seguro para guardar, se tiver criança ou adolescente em casa, ou ainda pessoas com problemas mentais? Um cofre? E para que serve a arma dentro do cofre? E quem vai ver se o armário, o cofre, a estante existe. Se tem escada para acessar?

– Será que eles têm noção do que representará de perigos dentro de uma casa? O feminicídio bate recordes, e em geral as mulheres são mortas dentro de casa.

– O desinteligente ministro Onix comparou arma em casa a liquidificador, que também pode machucar uma criança. Deus, eles não sabem o que fazem! Muito menos o que falam!

Tem muitas outras perguntas que iremos fazendo por aqui…

ARTIGO – Desaforos não se leva para casa. Por Marli Gonçalves

Tão de brincadeira. Ouço as ruas e me preocupo. Não ouço de um lado só; ouço o direito, o esquerdo, o desinformado; o influenciado e o influenciador. O idiota e o intelectual. A situação é esdrúxula, mas não só isso: é perigosa

Estica a corda. Estica. Uma hora ela arrebenta e é esse impasse previsível que tem deixado – a mim e a muitas pessoas às quais tenho grande apreço – mais do que preocupados, chateados e irritados. Desanimados total, achando tudo um porre, nada (nem ninguém) que preste. Estamos brincando em cima de uma panela de pressão – um país perdido sem direção e em crise econômica, institucional e vou dizer: em profunda crise existencial.

Jogadas políticas temerárias vem sendo feitas à luz do dia e na calada da noite. Alguns riem. O resultado do placar é que aparece diferente para cada plateia. De um lado, os estupefatos que aceitam as provocações e acham que a solução é fechar o tempo de vez, sem entenderem que a História não deve nem precisa voltar atrás aos tempos obscuros, cavernosos e sangrentos vividos, tempos que teimam em negar como se realidade não tivessem sido. Nesse grupo há ainda os crédulos em justiceiros falastrões para quem – os que o criticam – somos analfabetos, sem ter ideia de quantos milhões o são mesmo, sem solução, e que podem votar, mas não podem ser votados para lutar contra isso.

De outro, a jogada mais radical, feita para a torcida única de bandeirinha na mão que acha que só ela sabe o que é que é bom, o que é pobre, miséria, justiça social, arte engajada, e insiste em criar caso até o fim no que não será possível, infelizmente, de forma alguma, que seja executado em paz – essa é a certeza: a candidatura de Lula, o encarcerado que mais recebe visitas que podem ser chamadas de íntimas – sem sexo, e com grande incontinência verbal.

Tapas sequenciais na cara. E ninguém está a fim de virar o outro lado para ser esbofeteado de novo.

Deixe os meninos brincarem – diria um sábio ancião, observando esse caso lá de cima de uma montanha, de onde já não mais precisa descer para votar nesse tutti-frutti absurdo e desconexo de cabo a rabo que se apresentará nas urnas. Diria mais: que eles precisam sempre regar o grupo deles, para não perderem mais do que já perderam nesses últimos anos, os que despertaram do torpor infantil emanando da plantação do canto esquerdo do rio. Jogar para a galera é o que fazem.

Só que os meninos estão justamente brincando com fogo porque querem se queimar, há entre eles muitos que – nem um pouco meninos – sabem ser o choque inevitável e para lá exatamente por isso encaminham a comissão de frente. ONU. ONU? Isso é que é atirar para todos os lados. Nunca os vi mexer o traseiro para situações vexatórias de miserê.

Teremos dias exóticos, ainda mais exóticos, quero dizer, pela frente. Vamos observar. Debates e entrevistas, os mais divertidos. Uma das melhores coisas é lembrar que a maioria das perguntas que uns fazem aos outros e que os jornalistas cutucam não têm o menor interesse de verdade para a gente a resposta, a não ser por futrica. Ver se um vai dar uma bifa na cara do outro; se o efeito do calmante vai passar, se o sangue vai subir, se gravata combina com o terno, que inclusive está tudo muito masculino para o meu gosto, se plantaram ou pintaram cabelo é o que dá a audiência.

E o que é pior, se perguntássemos ou se a conversa girasse apenas sobre as suas propostas para o Governo, seria menos constrangedor o silêncio.

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Marli Gonçalves, jornalista – Que essa corda seja resistente e não rompa.

marli@brickmann.com.br; marligo@uol.com.br

2018

ARTIGO – E agora, brasileiros? Que é que a gente faz? Por Marli Gonçalves

Está aturdido? Percebeu só agora a causa de o país estar nessa bancarrota, e nós bancarrotados? Na lista tinha nomes pelos quais você ainda juraria de pés juntos? Sinto muito. O que a gente pode fazer? Vamos ficar parados, só olhando, ouvindo, achando que tudo isso vai passar e o mundo estará livre de ratos?

O que os olhos não veem o coração não sente. Pois agora não só estamos sabendo, como ouvindo e vendo, em detalhes formidáveis, a roubalheira que parece não ter mais fim e que não temos noção de onde foi exatamente esse começo. Talvez quando nos orgulhávamos do tal “jeitinho brasileiro”. Ou quando começaram a aparecer de todos os lados ídolos de lama, salvadores da pátria, guerreiros dos trabalhadores, do povo, libertadores? Gente parecida com agentes de trânsito que só sabem de esquerda, direita. De uma vez por todas, presta atenção naquela máxima “quando a esmola é muita até o santo…”

Não podemos substituir o coentro pelo cheiro verde, como diria a natureba Bela Gil. Então eu te pergunto, porque também estou me perguntando, angustiada. O que a gente faz, objetivamente? Na prática?

Não quero ser chata, mas informo: primeiro, que vem mais, muito mais por aí, e as revelações serão depuradoras; segundo, que não será a Justiça – nem se ela tomasse anfetamina e de repente aparecesse toda lépida, ágil, e moralizadora – a resolver a pergunta sobre qual país estará saindo disso tudo, que direção tomar. Sozinho não anda.

Continuo vendo na tevê as mesmas caras de pau, com os mesmos bocas-duras, línguas de trapo, os mesmos partidos, com as mesmas cantilenas, como se não fosse com eles o assunto. Desmemoriados. Contra o soro da verdade que, parece, embebedaram os delatores executivos, um relaxante, antes que começassem a dar o serviço. Não posso ter sido só eu que detecto alegria e certo alívio nas declarações, naturalidade sincera, ironia cáustica e vingativa nos detalhes e nos apelidos. Ah, os apelidos! São um capítulo à parte. Definitivos. Eles pagaram, gastaram, mas também se divertiram. Extorquiram e foram extorquidos. Mas botaram no papel – até programa especial inventaram – tim-tim por tim-tim, até porque precisavam cobrar os préstimos. E negócio entre malandros tem leis especiais, fora dos círculos oficiais. Igual droga.

Uma amiga querida, muito querida, está tão indignada que não consegue pensar em outra coisa que não seja o degredo de todos eles, vejam só. Degredo. Lembra que há 500 anos Portugal mandou para cá tudo quanto é gente que não prestava, e que agora seria hora de devolver esses que parecem ser seus descendentes. Suei para explicar a ela que seria uma sacanagem com o local escolhido para largá-los. Como ela está muito brava, também deve ter pensado numa cela gigante, um dragão engolindo a chave.

O problema – e nisso ela concorda – é que nada disso resolveria a questão principal. Como salvar o país que derrete sob nossos pés? Esses envolvidos são lixo que não dá para ser reciclado, altamente infectados.

Como lidar com essa vergonha que nos assola diariamente, nos deixa tão atônitos que acabamos esquecendo que algo precisará mesmo ser feito qualquer hora dessas, e o momento é agora, now? As Organizações Odebrecht acabaram. O Rei pode ser deposto. Não sobrou nem a pedra fundamental.

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20170227_154333

Marli Gonçalves, jornalistaNão. Nunca vi nada igual. Hora que é bom ser como sou, sempre fui, meio do contra. Mas estou anotando todas as sugestões que me parecerem sérias, porque não dá para se acostumar jamais com tanta sacanagem. Lista delas.

Brasil, escandalizado, humilhado, na encruzilhada, 2017

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